domingo, 13 de junho de 2021

A INSPIRAÇÃO DO PROFESSOR QUE APROVEITA INSERVÍVEIS NA HORTICULTURA DOMÉSTICA.

 Por Célia Ribeiro

Ao despertar, no último dia do ano letivo, os olhos no calendário confirmaram o que seu coração já sabia: em algumas horas, o garoto arteiro poderia extravasar, no seu habitat natural, a energia acumulada. Da infância, no Sul de Minas Gerais, o professor universitário José Augusto Guimarães guardou mais que belas memórias. Foi lá que ele estabeleceu uma forte ligação com a natureza e onde aprendeu o be-a-bá do cultivo de hortaliças que hoje pratica em casa utilizando materiais inservíveis.

Prof. José Augusto Guimarães

Nesta segunda parte da reportagem com o professor aposentado da UNESP, que esta coluna registrou domingo passado, ele mostra que, com um pouco de conhecimento e dedicação, dá para cultivar ervas aromáticas, legumes, verduras e frutas em pequenos espaços com custo mínimo. Basta despir-se de preconceito para lançar mão de materiais que iriam para o aterro sanitário, como caixas de isopor e garrafas PET que abrigam diferentes canteiros.

Caixas de isopor: canteiros na medida certa

Na fazenda dos avós maternos, na Zona da Mata Mineira, José Augusto recorda os bons momentos das férias: “Região montanhosa, ali eu passava cerca de quatro meses do ano, e foi onde pude tomar contato mais efetivo com a natureza, tirar leite, andar a cavalo, nadar etc. Foi ali, também, que nasceu e se desenvolveu, de forma mais efetiva, algo que considero um traço importante de minha personalidade: uma profunda necessidade de convívio com o verde, um especial prazer em conhecer as plantas e em colocar a mão na terra e plantar, adubar, podar, regar, enfim, cuidar. Ainda hoje, quando viajo, gosto de observar as árvores e plantas e resgatar, em meu baú de memórias, seus nomes, características, cuidados, etc”.

Calha no parapeito da janela abriga várias ervas

Daquele tempo, ele conta que “adorava passar o dia junto aos empregados aprendendo técnicas de cultivo. Aprendi muito. Também aprendi muito com os antigos almanaques de farmácia que davam dicas preciosas sobre épocas de cultivo, de poda, de colheita, de combate a pragas, etc. Gosto de cozinhar, basicamente pratos salgados, embora meu cardápio não seja muito extenso. Mas posso dizer que o molho pesto que eu faço, e presenteio os amigos, tem recebido elogios”.

Muitas pessoas que se arriscam na cozinha também zelam pela qualidade da matéria prima. E foi pensando nisso que o professor iniciou sua horta doméstica, optando por temperos tradicionais como salsinha e cebolinha, ervas aromáticas como manjericão, alecrim, sálvia, entre outras. No entanto, resgatando a curiosidade da infância, ele começou a testar novas maneiras de cultivo.

Frutíferas e ervas convivem em harmonia no quintal

Assim, um cano usado em calhas foi instalado em uma parede externa da residência e, no seu interior, foram plantadas mudas de verduras. De olho no “lixo zero”, as garrafas PET são utilizadas no plantio de alface em que ele aproveita um bargante de algodão para garantir a irrigação na medida certa.

José Augusto explicou que, “no caso da horta, utilizo caixas de isopor, usadas para transporte de salmão às peixarias, e as furo no fundo, coloco uma camada de argila expandida, cubro com manta ou com trapos de pano e coloco terra adubada. Esses recipientes são geniais pois têm 20 centímetros de altura, ideal para o cultivo de hortaliças, além de serem térmicos, impedindo que o calor de fora vá para a terra. Mas, também tenho um pomar em grandes vasos, morangos cultivados suspensos em pequenos vasos e ainda alfaces cultivadas em garrafas PET cortadas ao meio e sobrepostas, em um processo similar à hidroponia”.

Casca de ovo espanta
as lagartas

DEFENSIVOS NATURAIS

Ele assinalou que a preocupação com a qualidade vem em primeiro lugar: “Sempre procuro combater as pragas com produtos naturais, como óleo de neem, água de fumo e mesmo a técnica de colocar uma casca de ovo ao lado das couves para impedir lagartas. Se é superstição ou não, o fato é que as lagartas não aparecem”, revelou. 

Ele acrescentou que “para os caramujos uso a técnica de colocar um recipiente com cerveja na terra e, na manhã seguinte, recolher os caramujos que lá foram se alimentar, dica preciosa da querida amiga Lourdes Horiguela. Também utilizo como adubo o pó de café e a casca de ovo finamente triturada para garantir absorção, e as folhas secas eu utilizo como forragem no canteiro e, assim, impedir a rápida evaporação da água”.

A atenção que dedica à área verde de casa chega às frutas: “Com relação aos jardins, há um verdadeiro código social de que em jardim só se planta o que é ornamental, nunca um comestível. Isso não faz sentido pois uma hortaliça ou uma árvore frutífera pode compor perfeitamente com outras plantas desde que se tenha um olhar estético. Os europeus se utilizam fartamente desse recurso. No meu jardim, por exemplo, em meio a outras plantas, tenho um arbusto de nêspera, um cafeeiro, e ainda lima-da-pérsia e acerola. No jardim do fundo plantei uma amoreira em meio a um canteiro de antúrios”, explicou.

Dá para plantar quase tudo em vasos

O professor prosseguiu observando que mesmo quem tem pouco espaço em casa pode iniciar o cultivo orgânico do zero: “Pode-se plantar praticamente tudo em vasos. O importante é observar bem as características de cada hortaliça, se precisa de mais ou menos insolação, de mais ou menos regas, se tolera ou não vento, etc. Uma dica é sempre procurar dispor a horta em uma face que preferencialmente pegue o sol da manhã”.

Ele aproveitou para dar uma sugestão: “Começar sempre pelas ervas aromáticas, como manjericão, salsa, cebolinha, hortelã, alecrim, orégano, tomilho, endro, etc. Também é possível fazer um vaso com um coquetel de ervas aromáticas o que, além de útil, é muito bonito. O parapeito da janela da cozinha ou da área de serviço são espaços ideais para uma pequena horta de ervas aromáticas”, destacou. 

DICAS SIMPLES

Falando com entusiasmo sobre sua incursão na horticultura doméstica, José Augusto defendeu a importância da difusão de informações, sobretudo às populações de baixa renda que poderiam se beneficiar do cultivo em pequenos espaços para terem uma alimentação mais saudável e barata. E em espaços maiores servir como fonte de renda com a comercialização do excedente.

No entanto, observou que “essa população vulnerável, que vive na cidade e que já é urbana, não tem essas referências. Antes, era fruto do êxodo rural e vinha para a cidade conhecendo essas técnicas”. Por isso, defendeu a importância de se estimular a produção de hortas domésticas ou até hortas comunitárias aproveitando os conhecimentos passados entre as gerações.

Morango brotando no vasinho

Generoso, o professor compartilhou várias dicas simples: “Se essa população tiver esse tipo de informação, primeiro, ela vai ter alimentação de qualidade; se começa a plantar numa escala um pouquinho maior, pode até ter uma renda: pedaços de bucha vegetal e casca de coco verde, desses que são vendidos para água de coco, para abrigar orquídeas; tiras de meias femininas ou pedaços de barbante de algodão para amarrar orquídeas em árvores;  sempre cortar as flores do manjericão para que a planta se torne mais viçosa e dê mais folhas; de tempos em tempos, arrancar as cebolinhas e dividir os bulbos replantando-os; atentar para as sementes que saem das flores da salsinha, do endro e da erva doce”.

Garrafa PET com alface

E concluiu: “A dica final e mais importante: recolha folhas de suas ervas aromáticas e as disponha em uma bacia, deixando-as secar à sombra. Uma vez secas, passe-as por uma peneira fina para criar um pó de ervas. Esse pó de ervas é genial para ser usado em saladas, em temperos, no bolinho de arroz fica delicioso e, principalmente, misturado ao sal, no saleiro, pois diminui o consumo de sódio”. 

Pelo visto, as lições de pé no chão nas terras do Sul de Minas se enraizaram e o menino arteiro continua extravasando sua energia. Agora, na tranquilidade da horta da residência da família onde faz experimentos com a curiosidade de sempre.

Para ler a primeira parte desta reportagem, acesse AQUI




*Reportagem publicada na edição de 13.06.2021 do Jornal da Manhã 


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