domingo, 18 de novembro de 2018

LUTANDO CONTRA O PRECONCEITO E POR SEUS DIREITOS, OS OSTOMIZADOS QUEREM RESPEIT0.

Por Célia Ribeiro

No calor da campanha eleitoral mais imprevisível de todos os tempos, o atentado contra o então candidato Jair Bolsonaro jogou os holofotes sobre um tema pouco conhecido, alvo de preconceito e do desrespeito pela falta de informação: a Ostomia. Trata-se de uma intervenção cirúrgica que permite criar uma comunicação entre um órgão interno e o exterior com a finalidade de eliminar os dejetos do organismo. Os pacientes que utilizam bolsas coletoras (para urina ou fezes) chegam a 200 em Marília e mais de 1.000 na região, enquanto no Brasil estima-se um número surpreendente: 100 mil ostomizados que lutam para serem respeitados.
Célia mostra o Kit dos ostomizados
Segundo a presidente da Associação dos Ostomizados de Marília e Região, a fotógrafa Célia Castro, “qualquer doença inflamatória que faz com que rompa o intestino leva à ostomia. O câncer é um dos que batem recorde. Por causa da doença, é preciso amputar parte do intestino e desviar o fluxo para o abdome onde coloca a bolsa coletora”, explicou. Outra causa comum são os traumas, que foi o que ocorreu com Bolsonaro ao ter o intestino perfurado por um golpe de faca.

E foi o câncer que atingiu a presidente da ONG: um tumor na bexiga há mais de 30 anos. Neste caso, após muitos anos de tratamento, foi necessário fazer a urostomia quando a urina passou a ser desviada até uma saída no abdome onde é coletada em uma bolsa própria aderente à pele.
Banheiro especial para higienização

Ao lado do aposentado Salvador Santiago, também urostomizado e seu braço direito na Associação, Célia Castro está empenhada na luta pela divulgação do assunto tendo em vista o preconceito que, infelizmente, afeta quem precisou se submeter a uma cirurgia radical para salvar a vida e, em contraponto, foi obrigado a aprender a viver com algumas limitações.

ENGAJAMENTO

A Associação foi criada há 10 anos e desempenha um papel relevante: com ajuda de apoiadores e profissionais voluntários (psicóloga, enfermeira e nutricionista) são realizadas visitas domiciliares para acolher e orientar os novos pacientes, promovidos capacitações e eventos para troca de experiências.

O mundo dos ostomizados é quase um universo paralelo. Como a bolsa coletora fica no abdome, sob a roupa, a deficiência não aparece. Sim, os ostomizados são considerados deficientes pela Lei 5296. No entanto, muitos que tinham conseguido a aposentadoria por invalidez perderam o benefício e têm que recorrer à justiça para reaverem seu direito.
Reunião mensal dos ostomizados na entidade
Santiago contou que conseguiu aposentar-se por uma prótese no quadril e não pela ostomia. Ele destacou que “a gente quer dignidade, quer respeito na sociedade  como qualquer cidadão, seja qual for a deficiência. A gente fala do ostomizado, mas têm os mesmo direitos o cadeirante, o cego, o mudo e assim por diante. Não queremos ninguém passando a mão na nossa cabeça. Queremos nossos direitos respeitados”.
Sala de enfermagem na sede da ONG
As bolsas coletoras, tanto de urina como de fezes, são fornecidas pelo governo e custam caro: cerca de dois mil reais mensais por paciente. Através da DRS (Divisão Regional de Saúde) chegam às Secretarias Municipais para distribuição aos cadastrados. O processo de adaptação não é fácil e os recém-ostomizados testam os modelos de kits para identificarem o que fica mais confortável e não provoca reações na pele.
Alto custo: 200 reais por kit. São usados 10 por mês

São entregues 10 bolsas por mês, apenas. As de urina, com 600 ml, devem ser trocadas a cada três dias e as coletoras de fezes a cada quatro dias. É preciso muito cuidado para evitar que os dejetos não ultrapassem um terço da capacidade porque tem o risco de romperem provocando situações constrangedoras.

Uma das reivindicações da Associação, que tem se aliado ao Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, é conseguir uma lei municipal, a exemplo de Piracicaba, para que os locais públicos tenham o banheiro especial para os ostomizados, como terminais rodoviários, aeroporto, shopping etc.

“Em Marília, o único lugar que tem esse banheiro próprio para a higienização é este da Associação”, explicou Célia Castro mostrando o local que foi construído em uma ação da ONG “Amigos do Bar”. Quando viajam ou estão fora de casa, os ostomizados sempre levam uma garrafinha para colocarem água e poderem esvaziar os dejetos nos banheiros fazendo a higienização.

Árvore da gratidão: homenagem a todos que colaboraram
“Já pensou esvaziar a bolsa e depois ter que lavar na pia do banheiro, na frente de todo mundo?” perguntou Santiago. Por sua vez, Célia lembrou que nos estados mais desenvolvidos as bolsas coletoras chegam aos ostomizados, apesar dos atrasos que obrigam as entidades a se mobilizarem. Mas, “no interior do país, a gente sabe que tem muito ostomizado que coloca o saquinho de supermercado na barriga”, falou consternada.

PRECONCEITO

A entidade também pretende obter apoio do Legislativo na elaboração de leis voltadas aos ostomizados. Salvador contou que como a bolsa coletora está sob a roupa, quando utilizam filas prioritárias em mercados ou bancos nem sempre são compreendidos. Ele disse que chega a ser desesperador ficar muito tempo em uma fila enquanto a bolsa vai enchendo porque é um processo involuntário que os ostomizados não têm como controlar.
Na região, há mais de 1.000 ostomizados. Em Marília, 200 são atendidos.
Ele acrescentou que “a maior dificuldade é a adaptação por ser uma coisa nova. Primeiro, o maior sofrimento é imaginar que você vai para um outro mundo. Você não se imagina andando com uma bolsa cheia de urina indo trabalhar, pegando um ônibus ou indo ao supermercado. É o efeito psicológico da vida que se transforma. E depois, quando começa a superar as dificuldades psicológicas,  tem as dificuldades físicas, de discriminação, de preconceito. O maior problema é a desinformação da sociedade com respeito a isso. Tem muitas pessoas que não te respeitam porque não sabe nem o que é isso. Não é uma deficiência que você olha e vê”.
Célia Castro e Salvador: luta pela causa
Felizmente, há muitas histórias inspiradoras como o caso da cirurgiã-dentista Juliana Bimbatti, ostomizada desde criança que se casou e teve duas filhas. Ela ilustra o cartaz da ONG como um exemplo de superação.
A dentista operou quando criança, casou e teve duas filhas: superação

COMO AJUDAR


Boneca usada na
capacitação

Legalizada, a ONG não recebe subvenções e atua com ajuda de clubes de serviço, empresas e voluntários sensibilizados pelo trabalho desenvolvido. São promovidos eventos para arrecadação de recursos, como um bazar que deverá ocorrer em breve. Para contatar a entidade, que fica localizada em um prédio cedido pelo Hospital Espírita de Marília, escreva para:  aomarmariliasp@gmail.com Quem desejar contribuir: Sicredi, Agência 3022 Conta-Corrente 14304-9. As doações são registradas e a prestação de contas acompanhada por um contador voluntário.

Reportagem publicada na edição de 18.11.2018 do Jornal da Manhã



DIA NACIONAL DO OSTOMIZADO

Em comemoração ao “Dia Nacional do Ostomizado”, neste sábado (17), aconteceu um evento na praça da Igreja São Bento promovido pela Associação dos Ostomizados de Marília e Região. A programação, com informação e cultura (música e dança) contou com apoio da Secretaria Municipal da Cultura, Secretaria Municipal da Saúde, Emdurb, Agenda Marília, Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e ONG Amigos do Bar.
Célia Castro e Salvador(nas extremidades)

Associação Anjos Guerreiros esteve presente
Estiveram presentes, Pilar e Tadaumi Tachibana (Amigos do Bar), jornalista Carlos Rodrigues (SMS), Sônia Custódio (HC-Famema), João Bonini (AADEF), Associação Anjos Guerreiros, Samira Kalhil (Dança do Ventre), Paixão Eventos (sax com músicas de Jazz), Pastel & Cia, Tapioca da Dri e Barraca de milho verde.



Coral da Unimed
Crédito: Fotos cedidas pela Associação dos Ostomizados de Marília e Região

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