domingo, 15 de janeiro de 2012

A PAIXÃO PELAS ABELHAS UNIU DOIS APOSENTADOS QUE PRODUZEM MEL EM CASA, NA ZONA OESTE DE MARÍLIA.

Por Célia Ribeiro

Os longos anos de exposição a todo tipo de veneno, incluindo o temido BHC (Hexaclorocicloexano), pulverizado pelos trabalhadores sem os equipamentos de proteção disponíveis atualmente, provavelmente não afetaram dois aposentados da Sucen (Superintendência de Controle de Endemias) que, na melhor idade, mantém a sólida amizade nutrida por uma paixão em comum: a apicultura.

Lau e Dirceu: amigos de longa data
Para contar a história desses personagens intrigantes é preciso voltar à década de 50. Foi na infância que Wenceslau Gomes Soares (Lau), 73 anos, e Dirceu Manzon, 70 anos, se encantaram com a criação de abelhas. Durante toda a vida, através de tentativas bem e mal sucedidas, aprenderam as lições da atividade tornando-se referência na produção de mel, própolis, cera e pólen, em Marília.

A sintonia entre os ex-colegas de trabalho é tamanha que quando um fala o outro completa a frase! Ao contarem suas experiências, recordam o fascínio que a manipulação das colmeias exercia sobre os garotos da época. Lau, que  mantém uma barbearia na Rua Euclides da Cunha, ao lado da residência, lembra que aos oito anos de idade se interessou pelo assunto e não parou mais.

 Em casa, Lau possui várias colmeias por distração. A colheita profissional ele faz em colmeias estrategicamente instaladas nas matas ciliares do Rio do Peixe: “Já colhi mel de todo lugar. Já tive duas colmeias aqui, duas ali, em vários pontos, mas nada supera a qualidade do mel silvestre da beira do rio”, conta o barbeiro.
No alto do terraço de Dirceu, colmeias estrategicamente posicionadas
Devidamente certificado e membro da Associação de Apicultores, Lau segue à risca as normas sanitárias para colheita e processamento do mel, própolis e cera que vende a clientes cativos. Há mais de 40 anos! “A primeira vez que vi meu pai capturar um enxame de abelhas eu fiquei apaixonado”, recorda o apicultor que revela ter se aventurado sem nenhum preparo ou conhecimento.

Detalhe da colmeia no tubo
No entanto, assinala que é preciso estudar para conhecer melhor o assunto e elogia o trabalho da Associação de Apicultores: “A gente achava que não tinha nada para aprender. Mas, depois que comecei a frequentar vi que tinha muita coisa que não sabia”. Na confortável residência da Rua Euclides da Cunha, Lau mantém algumas colmeias que resistem às condições inóspitas da devastação ambiental.

O dublê de barbeiro e apicultor observa que as podas drásticas nas árvores dos bairros e o plantio de espécies inadequadas  quase inviabilizaram a criação de abelhas na cidade: “No viveiro de mudas da Prefeitura tem mudas de árvores que poderiam melhorar muito o pasto apícola, como a astrapeia que dá muita flor e atrai abelhas. Não sei por que caiu no gosto do povo plantar quaresmeira, espirradeira, que são tóxicas e não servem para as abelhas”.

Na casa do Lau, mel, própolis e cera: tudo certificado
PARAÍSO NO TERRAÇO

Apesar do trabalho e das manchas escuras na parede, que merecem sonoras broncas da esposa, dona Carmem, o aposentado Dirceu Manzon é um apicultor dedicado. No terraço da residência, localizada nas imediações da Igreja Maria Mãe, ele mantém dezenas de colmeias em lugares inusitados: das caixas de madeira e papelão, ao tubo plástico, tudo serve para manter em dia a produção de mel e própolis para consumo próprio.
Lau mostra colmeia
na varanda de casa

A fonte da juventude para Dirceu é tomar mel com própolis, diariamente, para garantir vitalidade e a imunidade contra doenças, além de sucos de vegetais que não dispensa no dia-a-dia. “Isso aqui é uma maravilha”, comenta, sorridente, além de iniciar uma sessão de degustação dos vários tipos de mel e própolis que não aceita vender.

Em três pavimentos acima da casa, uma profusão de plantas e hortaliças, cuja irrigação é garantida por um original sistema de gotejamento, o paraíso suspenso de Dirceu dá trabalho. Mas, também, muita satisfação. Ele fala com paixão das várias espécies de abelhas que cria e, como não poderia deixar de ser, tem sempre uma resposta na ponta da língua: “A abelha só se defende quando a gente a agride, quando passa na linha de voo”.

Quando o assunto é ataque, então, as histórias são muitas. Dirceu mantém em casa a terrível “Oxytrigona tataira”, mais conhecida como “caga-fogo” devido ao ácido que libera pela mandíbula quando se vê ameaçada. Esse peculiar sistema de defesa já rendeu queimaduras nos braços, abdômen e costas do Lau, alguns anos atrás, quando aceitou o desafio de vizinhos para retirar um enxame.
Dirceu e Lau no terraço

Rindo muito, os dois se divertem com as histórias e, mostrando que aprenderam a lição às duras penas, dizem manter a disciplina necessária para o manuseio adequado e seguro das colmeias e extração de mel: “Quando vamos fazer a colheita na beira do rio, longe da cidade, é uma festa, uma bagunça só. Mas, agora a gente toma muito cuidado”, revela Lau, que pretende continuar, ainda por muitos anos, brindando seus clientes com o doce sabor que a natureza, pacientemente, reservou.

 * Reportagem publicada na edição de 15.01.2012 do Correio Mariliense

8 comentários:

  1. Esta é nossa Marília Sustentável e este é o trabalho da Célia, gente que sabe valorizar nossa gente e as boas causas ambientais.

    ResponderExcluir
  2. Ivan, obrigada, querido! Foi graças à sua sugestão que conheci essas duas figuras maravilhosas. Abraços

    ResponderExcluir
  3. Oi Célia, bom dia! Começo meu domingo lendo sua reportagem.
    Adorei!
    Bjs

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigada, querida Edna! É um privbilégio ter leitoras como vc. beijosss

      Excluir
  4. Obrigada Célia, pela excelente reportagem e por poder mostrar um pouco da experiecia e do trabalho desses dois grandes apicultores, o qual tenho o grande prazer de conhecer e vivenciar as atividades desenvolvidas pelos mesmos, pois sou filha de um , o Lau e amiga do outro, o Dirceu.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Adriana, obrigada pelo comentário. Eu que agradeço a oportunidade de levar aos leitores do Correio Mariliense, e desse blog, o conhecimento sobre duas pessoas tão especiais. Grande abraço!

      Excluir
  5. Sou sobrinha do Lau e há muitos anos que vejo a admiração dele pela apicultura, atividade que exerce com muito prazer e responsabilidade. Parabéns Célia pela reportagem e parabéns ao meu tio e ao amigo Dirceu que dão lições de como cuidar bem do meio ambiente.Ana Firmino.

    ResponderExcluir
  6. Boa noite, Ana! Agradeço suas palavras. Foi um prazer fazer essa reportagem que merecia página dupla no jornal. Se vc quiser o arquivo PDF da página, exatamente como publicado no Correio Mariliense, escreva-me: mariliasustentavel@terra.com.br Abraços!

    ResponderExcluir

Seja bem-vindo(a). Seu comentário será postado, em breve.