domingo, 18 de março de 2012

O TRATAMENTO DE ESGOTO DE MARÍLIA, DA DÉCADA DE 40, PERDEU-SE NO TEMPO, LAMENTA AMBIENTALISTA.

Por Célia Ribeiro

Numa época em que se enxergava em preto e branco e a cidade tinha pouco mais de 10 mil habitantes, visionários relacionaram entre as causas da mortalidade infantil a falta de saneamento básico. Quase 70 anos depois, apesar de todas as informações disponíveis, Marília ainda se prepara para tratar o esgoto que continua sendo lançado “in natura” nos córregos e rios, ao passo que os três sistemas implantados na década de 40 perderam-se no tempo.

Voo de parapente na pista do Jardim Lavínia: potencial turístico
(Foto Ivan Evangelista)
A observação é do ambientalista e filósofo Emílio Carlos Peres, técnico agrícola e fundador da ONG Origem, que possui farta documentação sobre a história do saneamento básico mariliense. Autodidata, ele começou a se interessar pelo assunto ainda menino e hoje, aos 56 anos de idade, revela o mesmo entusiasmo da juventude quando fala sobre o assunto.

Emílio, ambientalista e filósofo

“Há 70 anos, já mostravam preocupação com a mortalidade infantil e doenças como a difteria”, observou Emílio Peres, lembrando que “cada casa tinha que abrir um poço e uma privada. Por isso, havia contaminação e doenças”. Conforme disse, “foram buscar na Alemanha o modelo de estação de tratamento de esgoto, segundo as normas da Organização Mundial da Saúde, para construir nas bacias do Pombo, do Palmital e do Barbosa”.

Projetadas para a população da época, conforme Marília crescia o sistema de três estações ficava insuficiente. Com o passar dos anos, comentou o ambientalista, os administradores preferiram investir em redes de água e na busca de novas fontes de abastecimento, como a construção das adutoras do Rio do Peixe, na década de 60, pelo prefeito Armando Biava.
A beleza do entorno de Marília, com seus itambés, deveria
ser preservada. (Foto Ivan Evangelista)

 “Naquele tempo, as estações de tratamento de esgoto funcionavam que era uma beleza. Eles tratavam o esgoto, colhiam o resíduo e vendiam como adubo para os pomares e plantações de café, principalmente”, revelou Emílio Peres. Daquelas construções, ficaram somente as estruturas de concreto abandonadas, sem utilidade, lamentou.

No fim dos anos 70, canalização do Córrego do
Pombo (Foto Comissão de Registros Históricos)
EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Emílio Peres criou os três filhos em contato com a natureza. Ele costumava acampar nas proximidades da cidade se reabastecendo da energia do verde e das águas límpidas de rios e córregos. Para ele, que já ocupou o cargo de coordenador ambiental na Prefeitura, muitos anos atrás, a cidade precisa acordar para promover a educação ambiental e preparar os marilienses do futuro segundo uma visão preservacionista.

Ação da ONG "SOS Rio do Peixe" plantando mudas de
peroba rosa em Nóbrega (Foto Ivan Evangelista)
 Atuando na elaboração e gerenciamento de projetos de sustentabilidade na região, o ambientalista vê com tristeza “o pouco interesse que o assunto desperta nas pessoas”. Ele lembrou que a recuperação de áreas degradadas e os cuidados para evitar danos ainda maiores vão trazer benefícios diretos às futuras gerações.
Exemplo de preservação: roda d'água em nascente em área
do Distrio de Nóbrega (Foto: Ivan Evangelista)

"Pássaros pretos do brejo" que só se procriam em áreas
preservadas, no flagrante de Ivan Evangelista
Na opinião de Emílio Peres, o entorno de Marília, com os itambés e áreas verdes cortadas por córregos, tem potencial para gerar negócios como o turismo ecológico trazendo benefícios econômicos para a cidade e, consequentemente, para a população. Mas, faz um alerta: se a sociedade civil não se engajar e lutar para reverter esse processo de degradação, e os políticos não se comprometerem, pouca coisa restará para quem for contar a história de Marília do século 21.

 *Reportagem publicada na edição de 18.03.2012 do Correio Mariliense

DICA VERDE

ROTA DA RECICLAGEM

Na véspera do quarto aniversário, o buscador Rota da Reciclagem , o primeiro da internet brasileira que aponta cooperativas, pontos de entrega voluntária e comércios ligados à cadeia de reciclagem, atinge a marca de 500 mil acessos.

Criado pela Tetra Pak, com suporte do Google Maps, o site já conta com mais de 3.400 iniciativas cadastradas, incluindo Marília, e tem a missão de ajudar os consumidores a encontrarem pontos de coleta seletiva para destinarem as embalagens longa vida pós-consumo e outros resíduos para a reciclagem.

Para realizar a busca, basta digitar o endereço de localização para a ferramenta apontar os pontos mais próximos. De acordo com Fernando von Zuben, diretor de Meio Ambiente da Tetra Pak, no início deste ano o buscador também foi lançado como aplicativo para iPhone e iPad e pode ser baixado gratuitamente pela Apple Store. “O nosso objetivo é conscientizar a população, tornar as informações da cadeia da reciclagem disponíveis e, desta forma, aumentar o volume de embalagens recicladas no país”, completa Fernando. (Fonte CDN – Comunicação Corporativa)

domingo, 11 de março de 2012

UM BANCO FEITO DE SOLIDARIEDADE SALVA MILHARES DE VIDAS INDEFESAS EM MARÍLIA E CIDADES DA REGIÃO.

Por Célia Ribeiro

Uma estrutura complexa, que exige um rigoroso controle de qualidade, funciona como um relógio suíço, independente de suas instalações, que nem sempre foram adequadas. O segredo do Banco de Leite Humano (BLH) de Marília está no comprometimento da equipe multidisciplinar liderada pela enfermeira Sandra Domingues. Unindo conhecimento técnico a uma sensibilidade invejável, na condição de mãe e avó, ela entende a importância da promoção do aleitamento materno exclusivo e da doação do leite humano para a sobrevivência de seres indefesos que chegam ao mundo pesando até inacreditáveis 500 gramas!
Rigoroso controle de qualidade
Na semana em que se comemora o “Dia Internacional da Mulher”, o Correio Mariliense deu um mergulho neste universo fantástico que envolve doação de corpo e alma. Ouvimos a coordenação do Banco de Leite Humano, vinculado à Secretaria Municipal da Saúde, e também jovens doadoras que alimentam seus filhos e ainda ajudam a salvar a vida de bebês internados nas UTIs Neonatais de Marília e região.

Gratidão: essa palavra está sempre presente nos lábios de Sandra Domingues. Ela recorda o início do Banco de Leite, quase 30 anos atrás, quando começou a funcionar próximo ao Yara Clube. Agradece a todo o momento, a dois ex-secretários municipais da Saúde --- Dr. Antônio Domingues e Dr. Ênio Sevilha Duarte --- pelo apoio ao BLH e, como não poderia deixar de ser, manifesta sua gratidão aos funcionários do banco que superam desafios, diariamente, para que a estrutura não páre.

Sandra Domingues: gratidão
A trajetória de Sandra Domingues merecia uma reportagem à parte. Afinal, ela começou sua atuação na saúde pública pelo Distrito de Dirceu. Sem saber, já praticava a “Saúde da Família”, ao visitar os moradores e dar um atendimento humanizado a todos que procuravam o postinho do lugar.
Entretanto, é como coordenadora do Banco de Leite Humano que aparece sua face mais vistosa. Instalado em um prédio amplo na Avenida Santo Antonio, antiga sede da Polícia Federal, o BLH coleta e processa cerca de 2.000 litros de leite humano por ano, segundo as mais rigorosas normas preconizadas pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

CONTROLE DE QUALIDADE
Antes de ser pasteurizado, o leite passa por diversas análises. Da mesma forma, a sorologia das doadoras é encaminhada para o Hemocentro de Marília para garantir qualidade total ao produto oferecido aos bebês em situação de risco. Além de Marília, onde o único veículo do BLH passa recolhendo as doações nas residências das doadoras cadastradas, são recebidas doações de cidades da região.

Alguns anos atrás, Sandra Domingues observou um grande número de bebês, internados nas UTIs de Marília, provenientes de municípios da região: “Nossa maior preocupação era qual alimento esse bebê receberá depois se essa mãe não é trabalhada? Nosso olhar tinha que ser mais longe porque matávamos a necessidade naquele momento, mas ao ter alta, tínhamos que pensar na saúde e na qualidade de vida desse bebê”.
Ivanilde mostra parte da doação
que faz em uma semana
Foi quando o BLH avançou para a região, sensibilizando os dirigentes de saúde para a causa. Hoje, há 12 postos de coleta em cidades como: Pacaembu, Lucélia, Adamantina, Pompéia, Quintana, Lupércio, Vera Cruz, Alvinlândia, Garça, Herculândia etc. As equipes foram treinadas para promoverem o aleitamento materno, apoiarem as mães, e também captarem doadoras, cujo leite é encaminhado para Marília. O BLH fornece toda a vidraria esterilizada.

ESTRUTURA
No Banco de Leite Humano de Marília funciona o Ambulatório Municipal de Aleitamento materno com médica pediatra, odontopediatra, entre outros profissionais. No BLH, há defasagem de pessoal e nem mesmo um auxiliar de escrita foi designado para digitar os dados enviados à Secretaria Municipal da Saúde. Além disso, o banco só funciona de segunda a sexta-feira, sendo que aos sábados tem plantão não remunerado. Ou seja, os funcionários se revezam e armazenam horas para posterior utilização, lamenta a coordenadora.

Em Marília, nascem entre 300 e 400 bebês por mês, assinala Sandra Domingues, citando que o ideal seria contar com 100 doadoras de leite. No entanto, atualmente, apenas 46 mães estão doando, semanalmente ao BLH. Ela destacou que além da promoção do aleitamento com atividades voltadas às mulheres, como palestras e eventos próprios, o Banco de Leite dá todo suporte às mães que têm dificuldade para amamentarem seus filhos.
O final do ano e o inverno são dois períodos críticos para a coleta de leite: primeiro porque coincide com viagens de férias e, no caso das baixas temperaturas, ocorre a vasoconstrição que dificulta a retirada do leite humano.  Sandra Domingues não se importa de pegar o próprio carro e dirigir até alguma cidade da região se lá houver leite em condições de atender alguma emergência em Marília. Não importa o dia nem a hora!

Feliz por ter amamentado a filha caçula por 4,5 anos, Sandra Domingues agora vê a filha mais velha amamentar sua neta. Visivelmente emocionada, ela justifica sua dedicação à causa: “Você precisa ter amor pelo que faz. Eu sei para quem eu faço. Você está vendo um ser humano de 500, 600 gramas que precisa de você, lutando para sobreviver”, disse sem controlar as lágrimas.

Lamentando não ter a estrutura e o apoio necessários ao BLH, a coordenadora não desanima, lembrando que o trabalho é essencial, independente da classe social. Nas UTIs Neonatais, há bebês prematuros de mães do SUS, portadoras de convênios e particulares. No entanto, nenhum convênio médico, que se beneficia desse leite que salva vidas, auxilia o BLH.
A doadora Ivanilde e a filha Bianca, que dorme tranquilamente.

Finalizando, Sandra Domingues disse que “às vezes, nós mulheres e mães nos preocupamos que nossos filhos não tenham fome. As mulheres produzem um alimento que foi uma dádiva de Deus e que elas podem alimentar seus filhos e matar a fome de um bebê que elas não conhecem, mas que precisa delas para salvar sua vida”. 
O Banco do Leite Humano de Marília fica na Avenida Santo Antônio, 136. O telefone é (14): 34138696.

JOVENS DOADORAS
Mãe de primeira viagem, a biomédica Natália Bernine Gallo, 26 anos, recorda que no começo tinha dificuldade em amamentar. Encontrou ajuda no Banco de Leite Humano e hoje, além de alimentar a pequena Giovana, de dois meses, coleta até 03 frascos de 500 ml de leite, por semana. “É muito importante doar. Já que tenho leite para alimentar minha filha, porque jogar fora o excedente se tem bebês precisando?”, observa.

Natália e a pequena Giovana
Mais experiente, a estudante de Administração, Ivanilde Neves Silva, de 37 anos, já é mãe de Matheus, 05 anos. Quando chegou Bianca, atualmente com três meses, ela não pensou duas vezes: “Eu tenho bastante leite e sei da dificuldade de muita gente”, disse. Ela se programa para retirar o leite, que congela até que a viatura do BLH passe para recolher, e ainda guarda para a filha tomar enquanto ela estuda à noite. Ivanilde conta com alegria que consegue doar entre 06 e 07 frascos de 500 ml de leite por semana!

* Reportagem publicada na edição de 11.03.2012 do Correio Mariliense

domingo, 4 de março de 2012

HORTA COMUNITÁRIA DA ZONA OESTE DE MARÍLIA RESISTE COM O SUOR DE POUCAS FAMÍLIAS

Por Célia Ribeiro

Num dos pontos mais altos da zona oeste de Marília, quando o sol começa a se despedir, um véu delicado de gotículas de água se espalha nos vigorosos canteiros de hortaliças e legumes graças à engenhosidade de um modesto sistema de irrigação. Se não fosse por ele, o projeto comunitário, idealizado pela artista plástica Márcia Zaros no terreno anexo ao Poliesportivo Américo Capellozza, já teria sucumbido a exemplo da esperança das famílias que desistiram do sonho de revitalização do bairro.
Jaqueline Alexandre
O projeto “Bairro Vivo”, que chegou a contar com 30 famílias de trabalhadores, hoje patina para sobreviver com apenas oito famílias. Elas resistem, enfrentando as jornadas sob sol escaldante, para trabalharem a terra onde cultivam todo tipo de verduras e legumes, além de plantas medicinais.

Dona Nilza e os frutos do trabalho
Desde a última reportagem do Correio Mariliense, um ano atrás, ao invés de melhorar, a situação só piora a cada dia. A notícia de que a Prefeitura construiria um barracão para acomodar a cozinha comunitária, o depósito de ferramentas e insumos, além de sanitários, deu novo ânimo aos moradores, conta Márcia Zaros.

No entanto, devido às dificuldades financeiras alegadas pela administração, até agora a ideia está no papel: “Só temos o apoio da Secretaria da Agricultura que nunca nos abandonou”, observou a líder comunitária. Por isso, o plano de desenvolvimento de oficina de sabonete vegan, que tem muita procura e ótimos preços, a produção de sabão artesanal e doce à base de frutas, além do fornecimento de sopão aos moradores, são apenas sonhos que se esvaem a cada amanhecer.

Márcia Zaros
“Não temos as mínimas condições. Não temos onde guardar as ferramentas e quando deixamos na horta, elas são roubadas. Não temos banheiro, nem um quiosque com sombra pra gente tomar água e descansar”, resume Márcia Zaros. Ela conta, com tristeza, que os voluntários da hora comunitária trabalharam duro para produzirem e venderem legumes e hortaliças juntando dinheiro necessário à compra de um pulverizador. Em pouco tempo o equipamento, de grande utilidade, foi furtado para decepção geral.

ECONOMIA NO BOLSO

Márcia Zaros se abastece de otimismo no contato com os voluntários que se dedicam à horta. Eles se revezam no plantio, na remoção de ervas daninhas, e na manutenção dos canteiros e colheita. Duas vezes por semana, cada uma das oito famílias leva sacolas cheias de tudo o que ajudaram a plantar: alface, almeirão, couve, quiabo, cenoura, beterraba, tomate, mandioca, berinjela, pimenta, pimentão, abobrinha, abóbora, milho, salsa, cebolinha etc.

Legumes e verduras à vontade para as famílias
“Quem trabalha na horta tem a gaveta da geladeira cheia do que tem aqui. Um voluntário que tinha saído pediu para voltar porque sentiu no bolso o custo desses alimentos que ele tem de graça na horta”, contou a líder comunitária. Segundo disse, “muita gente vem aqui e fica encantada com esse trabalho. Mas, não conseguimos ajuda, até agora, para termos nosso espaço. Acho que temos que trabalhar mais duro ainda, aumentar a produção, vender e juntar dinheiro para construirmos sozinhos. O difícil é que tudo custa muito caro”, lamentou.

 MÃOS À OBRA

Na tarde da última quinta-feira, a sorridente jovem Jaqueline Fernanda da Silva Alexandre estava ajudando na formação de novos canteiros. Casada, aos 20 anos, disse que enquanto não começar no novo emprego aparece para ajudar na horta e, claro, levar sua parte dos legumes e verduras orgânicos produzidos no local.
Sr. Mário, vitalidade aos 82 anos
Ao seu lado, a viúva Nilza Maria de Lima Cassoli, 63 anos, se protegia do sol com chapéu e luva mostrando grande habilidade no trato da terra: “Quando eu era criança morava na roça. Adoro plantar e colher. Por mim, isso aqui estava cheio de gente trabalhando”, disse.

Enquanto isso, o mais antigo ajudante da horta, “Seu” Mário esbanjava vitalidade aos 82 anos. De enxada na mão, Márcia disse que ele era o guardião dos canteiros porque sua tarefa era livrar as plantas das ervas daninhas. Pai de nove filhos, o aposentado entende de fertilidade e, muito simpático, não parava um minuto, nem para dar entrevista.

ESPERANÇA

Márcia Zaros não se esquece de agradecer a algumas pessoas que têm colaborado com o projeto. Ela citou o “Carlão do Mercadinho”, de quem não recordava o sobrenome, mas disse ser bem conhecido por todos: “Sempre que quebra alguma ferramenta ou falta alguma coisa, o Carlão é quem nos socorre. Ele compra nossa produção excedente e assim podemos continuar nosso trabalho”.

Irrigação salvadora
No caso da irrigação, Márcia pesquisou alternativas na internet e foi em busca de ajuda. Do secretário de Serviços Urbanos, José Expedito Capacete, conseguiu a doação de uma caixa d’água de 3.000 litros: “Foi uma doação pessoal que ele nos fez, do próprio bolso”, ressaltou. O sistema que leva água e evita que os voluntários fiquem até três horas sob sol forte foi providenciado com a ajuda, pra variar, do “Carlão do Mercadinho”.

A irrigação deu à horta comunitária um suspiro de vida que, apesar de pequeno, tem sido suficiente para manter unidas as famílias que acreditam ser possível transformar a realidade em que vivem a partir da união e do trabalho. De muito trabalho digno.

Para conhecer o projeto, acesse o blog: www.projetobairrovivo.blogspot.com

* Reportagem publicada na edição de 04.03.2012 do Correio Mariliense