Por Célia Ribeiro
No fim de
2014, o cenário sombrio vislumbrado pelos analistas econômicos alertava que o
ano de 2015 seria de muitos desafios. Para uma instituição filantrópica, cravada
na periferia de Marília/SP e acostumada a todo tipo de dificuldade, este seria
mais um ano de trabalho duro para fechar as contas. Só que não. Quando janeiro
chegou, a Associação Amor de Mãe se viu diante de um dilema que a obrigou a
adotar medidas drásticas para continuar de pé, como a redução de 140 para 60 no
número de crianças assistidas.
Hora de brincar: crise reduziu as vagas |
Criada há 08
anos a partir do trabalho social da Pastoral da Criança da Paróquia Nossa
Senhora do Perpétuo Socorro, a Associação Amor de Mãe é uma das mais sérias
instituições filantrópicas de Marília. Fundada e dirigida pela professora
voluntária Tammy Regina Gripa e sua mãe, Marluci Silva Gripa, a entidade goza
de tanta credibilidade que possui dezenas de parceiros e apoiadores na
iniciativa privada e entre entidades de classe, universidades e clubes de
serviço.
A Prefeitura
colabora com a doação de alimentos para o preparo de refeições e cede recursos
humanos. No entanto, para manter o atendimento às crianças da zona oeste,
sobretudo do Jardim Califórnia e adjacências, a instituição promove eventos
(jantares, bazares e feiras de sobremesa) e investe em projetos de geração de
renda para garantir sua sustentabilidade econômica.
A padaria
industrial, construída e equipada pelo Supermercado Tauste, produz uma grande
variedade de produtos (pães, roscas, salgados etc) que são comercializados em
bancas no final das missas da Igreja Santa Izabel (sábado à noite) e Paróquia
Santa Clara (domingo pela manhã), além de receber encomendas com entrega em
domicílio.
Caixa zerado
“Quando janeiro
chegou, não tinha nada em caixa. Tínhamos muitos débitos e não sabíamos o que
fazer. Mesmo com as crianças em férias, as dívidas continuavam, como encargos
com funcionários, água e luz”, recordou Tammy Gripa. Sem saída, ela partiu para
a única opção disponível: “Desesperada, fiz um empréstimo pessoal e paguei as
dívidas”, contou, explicando que o fôlego provisório deu um alívio para virar o
jogo.
“Comecei a
correr atrás de novos projetos e inscrevi um no Banco do Brasil. Felizmente,
ele foi aprovado e a verba veio em março, R$ 5.600,00 por mês, até o fim do
ano, para pagamento de funcionários, psicopedagoga, psicóloga, assistente
social e mais um professor”, informou a diretora.
O projeto
apoiado pelo Banco do Brasil previa o atendimento de apenas 60 crianças,
selecionadas entre as que apresentassem dificuldades de aprendizado e
estivessem em situação de risco, além de pertencerem a famílias de baixíssima
renda. Neste novo cenário, a Associação Amor de Mãe precisou reduzir de 140
para 60 o número de atendidos, além de suspender as oficinas (de violão, flauta,
balé, artesanato etc) que espera retomar futuramente.
“O projeto é
para crianças que têm problemas, com pais separados, cuidadas pelas avós, que
têm pais presos ou drogados, ou têm transtornos na escola e ninguém consegue
fazer nada. Esses problemas gritantes é que estamos trabalhando este ano”,
explicou Tammy. Ela contou que “em fevereiro, no início das aulas, reuni todos
os pais e dissemos que não teria mais as oficinas e iríamos fazer a seleção
para crianças de 05 a 11 anos: quem mora na região Oeste e tem renda de até
dois salários mínimos”.
A entidade
sempre atuou em duas frentes: desenvolvendo projetos de geração de renda para
as famílias e a assistência às crianças que frequentam o local no contra turno
da escola. Lá, fazem as tarefas escolares com acompanhamento, recebem
alimentação e, antes das mudanças, também participavam de oficinas culturais.
Com uma
estrutura bem montada, a Associação Amor de Mãe segue buscando alternativas
para ampliar a arrecadação e formar mão de obra entre as mulheres desempregadas
que desejam aprender um ofício. Neste sentido, o curso de salgados ministrado
em parceria com a FATEC, em maio, capacitou as mulheres que perderam o emprego
na crise econômica. Com inscrições gratuitas, o curso recebeu doação da matéria
prima do Leilão Solidário.
Bolsas artesanais
Aproveitando
as instalações da sala de costura, a instituição está produzindo, em caráter experimental,
bolsas com tecidos de mostruários de estofados doados pelas empresas. As peças
estão sendo comercializadas para ajudarem na manutenção da entidade, assinalou
Tammy Gripa.
“Todos os
dias fazemos alguma coisa para sobreviver. Na Japan Fest, onde fomos muito bem
acolhidos, fizemos pão de mel que renderam mil reais e ajudaram a pagar as
contas de água e luz. No Esmeralda Shopping, nossa feira da sobremesa rendeu
600 reais e assim vamos em frente”, comentou a diretora.
Na agenda,
estão marcados uma feira da sobremesa no Tauste Norte (dia 06/06) e o I Baile
Jantar do Dia dos Namorados (dia 12/06) no Alves Hotel, a 35 reais o valor do
ingresso individual.
Quanto à
retomada das atividades, Tammy espera voltar aos poucos com as oficinas “porque
as crianças, sem terem o que fazer, ficam na frente da televisão”. Uma das que
mais sentiu a desativação foi a de balé. Ela recordou a apresentação das
meninas, no final de 2013, no Teatro do Colégio Sagrado Coração: “Foi
emocionante e muito lindo. Fazer balé é sonho de uma criança rica e não de uma
criança pobre. Essas crianças não podem sonhar mais porque precisaríamos de um
patrocinador”, pontuou.
Uma das mais
ansiosas pela volta das aulas de balé é Yasmim Tainara, nove anos, moradora do
Jardim Califórnia. “Ela se destacou muito e até recebeu um prêmio por sua
dedicação”, revelou Tammy Gripa. A menina disse que o balé a ajudou muito na
parte de disciplina e organização: “Quero muito que volte logo”, disse. Ao seu
lado, Bruna Pereira, 12 anos, contou que gostava das aulas de balé porque a
atividade a ajudou a perder um pouco da timidez.
Aprendendo com a dor
“Não podemos
perder tempo porque já sofremos muito”, assinalou Tammy Gripa que já está
elaborando projetos para 2016. “Aprendemos muito com o sofrimento do ano
passado. E hoje aprendemos com quem realmente sofre. Sofrem essas crianças que
nem se imagina. Tenho vítimas de violência sexual, tenho vítimas de drogas, de
criança que foi gestada com os pais no auge do crack”, desabafou.
A mudança no
perfil dos assistidos, pelo visto, veio reforçar a determinação da instituição
em manter-se de pé, apesar de todas as dificuldades, procurando alternativas de
geração de renda para voltar a atender a clientela especial que tanto necessita
desse apoio.
Para
encomendar pães, salgados (quibe, coxinha, rissoles, bolinhas de queijo) a
partir de cinco reais a bandeja e outras delícias, telefone para: (14) 3422.5525.
Para saber
mais, Marília Sustentável publicou outras reportagens sobre a entidade que você
confere clicando nas datas: 2010, 2011 e 2013.