No sertão nordestino, o menino
caminha lentamente sob sol forte, lata na cabeça, levando o precioso líquido
para casa. No trajeto, cuidando para não derrubar a água conseguida com
dificuldade, sonha acordado com uma vida melhor, onde contemplará o verde ao
abrir a janela e a água, abundante, jamais será desperdiçada. Cinquenta anos
depois, João Urbano de Sá realizou o que parecia impossível: comprou um pedaço
de chão, formou uma reserva natural com centenas de espécies nativas, planta e
colhe os alimentos para subsistência da família e goza a aposentadoria pescando
no quintal de casa.
Palmito à vontade no quintal |
A saga do “Seu”João, conhecido por Gelson,
e dona Laurinda, a esposa mineira, será contada nesta edição e também no próximo
domingo. Casados há 40 anos, pais de 04 filhos e avós de 08 netos, eles
sonharam juntos e, sem saber, estabeleceram metas dignas do planejamento
estratégico das empresas modernas. Assim, passo a passo, atingiram os objetivos
vislumbrados na vida dura do campo.
Ajeitando a rede na varanda, o cearense
de fala arrastada volta no tempo rememorando como formou, na pequena
propriedade de 7.000 metros quadrados, localizada em um condomínio de chácaras
às margens dos itambés da Rodovia Marília – Bauru, o paraíso dos sonhos de
infância. Quando tinha oito anos, a família de João saiu do Ceará, fugindo da
seca, em busca de uma vida melhor em Minas Gerais: “Nasci e fui criado na
roça”, disse, assinalando que continuou no campo mesmo depois de casar-se com a
mineira Laurinda.
Dona Laurinda e João Urbano: sonho realizado |
Horta orgânica recebe água da chuva |
TERRA PROMETIDA
Já que a família era prioridade, João
decidiu mudar-se para Marília, 30 anos atrás. Retomou as viagens, agora como
caminhoneiro, sem esquecer o sonho de infância: ter um pedaço de terra para
plantar e viver em paz. Quando residia no bairro Chico Mendes, a oportunidade
surgiu na forma de um novo loteamento. O casal juntou as economias e encarou 36
prestações de dois mil reais pela área.
Mais de 150 galinhas criadas soltas na propriedade |
O pomar do “Recanto Mineiro” como é
chamado, tem um pouco de tudo: pés de limão, banana, laranja, jabuticaba,
goiaba, maçã, maracujá (doce e azedo), pêssego, pinhão, pequi, romã, tangerina,
seriguela, uva, louro, macadâmia, abricó, carambola, côco, gabiroba, graviola,
framboesa, entre outras.
Para irrigar a plantação, inicialmente
ele perfurou um poço caipira. Mas, assim que se aposentou, há quatro anos,
construiu a espaçosa casa de 110 metros quadrados, instalando um sistema de
calhas para coleta da água da chuva. Em duas caixas, são armazenados 6.000
litros de água utilizada na horta orgânica e na irrigação do pomar. “Dava dó
ver tanto desperdício de água quando me lembro do tempo que carregava lata
d’água na cabeça”, comentou, justificando o investimento.
Água da chuva é armazenada nos tanques de 3.000 litros cada um |
Aos poucos, o que parecia miragem
ofuscando a visão dos viajantes sob sol escaldante transformou-se no oásis
sonhado desde a mais tenra idade. No recanto não falta nada: mais de 150
galinhas garantem ovos orgânicos e em três tanques há criação de tilápias,
curimbas e pacus. O feijão, a mandioca e outros alimentos são cultivados para o
consumo. E nem a rapadura faz falta: os pés de cana-de-açúcar garantem a
matéria prima extraída pelo engenho guardado no quiosque que João construiu
para os churrascos de fim de semana da família.
RESERVA NATURAL
Desde que adquiriu a área, João Urbano
focou no objetivo de morar no paraíso. Com cuidado, a cada viagem pelos quatro
cantos do Brasil ele trazia mudas na boleia do caminhão. “Eu molhava uns panos
e cobria as mudas. A cada cinco ou seis horas eu parava e molhava de novo.
Assim, elas chegaram inteiras até aqui vindas de toda parte, da Amazônia,
Tocantins, Pará, do Sul etc”, revelou.
Criação de peixes garante o lazer da família |
Em contraponto à seca do lugar que
nasceu, o caminhoneiro vive cercado de água. Mas, sem desperdício, honrando a
promessa que fez quando menino. A água do poço desce por gravidade até um
reservatório que fez com as próprias mãos e de lá segue para os tanques de
peixes. Também há uma tubulação que leva ao orquidário, lugar preferido de dona
Laurinda. Essa água de qualidade, atestada por exames que João sempre manda
realizar, serve toda a família.
Flor o ano inteiro no orquidário da dona Laurinda |
Comida caseira no fogão à lenha: tudo como antigamente |
Parabéns pela matéria prova que cada qual escolhe a estrada pela qual vai caminhar,estou ansiosa pela continuação desta bela história .
ResponderExcluirQuerida Mariah, obrigada pelo comentário. Eu tbem me emocionei ao conhecer essa história. Bjsss
Excluirparabéns pela matéria prova que cada qual escolhe seu caminho.estou ansiosa pela segunda parte.
ResponderExcluirSensacional essa história, Celinha! Parabéns por descobrir o sr. João Urbano e contar pra gente um pouco da história dele, uma história muito inspiradora. E melhor ainda saber que ele escolheu Marília pra morar e que tem essa maravilha pertinho da gente. Parabéns pela matéria, muito legal, estou aguardando a segunda parte. Um abraço!
ResponderExcluirMuito obrigada, caros! Muito bom ter esse feedback de vcs! Grande abraço
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