Por Célia Ribeiro
“Espatódea,
gineceu, cor de pólen, sol do dia”...Quando Nando Reis compôs a canção
“Espatódea” para homenagear a filha Zoé, de lindos cabelos ruivos, não
imaginava que esta espécie de árvore, originária da África e muito comum no
Brasil, seria responsável pela mortandade de abelhas na zona urbana. Em
Marília, o fenômeno chamou a atenção do apicultor Wenceslau Gomes Soares, o
“Lau”, que luta para erradicar as espatódeas do bairro Lorenzetti, na zona
oeste da cidade.
Barbeiro por
profissão, Lau dedica-se à apicultura há mais de 40 anos. Membro da Associação
de Apicultores de Marília, ele é uma das referências na produção de mel,
própolis, cera e pólen conforme reportagem desta página mostrou na edição de 15
de janeiro de 2012. Junto com o amigo Dirceu Manzon, também aposentado da SUCEN
(Superintendência para Controle de Endemias), possui apiários em casa por
distração e dedica-se à apicultura comercial nas colmeias instaladas ao longo
da mata ciliar do Rio do Peixe.
Esta semana,
preocupado com o grande número de abelhas mortas, encontradas nas flores que se
desprenderam das espatódeas do bairro, ele desabafou: “Com tantas espécies de
árvores boas para plantar, ainda insistem em ter quaresmeiras, espirradeiras e
espatódeas que são veneno puro para as abelhas. No dia em que acabarem com as
abelhas, também vai acabar o homem”.
Bem
informado quando o assunto é apicultura, Lau observou que as agressões
constantes ao meio-ambiente estão afetando diretamente as abelhas, responsáveis
pela polinização de milhares de espécies de plantas. Sem elas, os reflexos ao
equilíbrio do ecossistema são incalculáveis, frisou.
“Na Europa,
os produtores de mirtilo pagavam 40 dólares por colmeia para garantir a
polinização. Hoje, estão pagando 150 dólares por colmeia porque as abelhas
estão desaparecendo”, ressaltou o apicultor que espera ver em prática a
resolução que prevê certos cuidados na aplicação de defensivos agrícolas em
áreas exploradas pela apicultura.
INDIGNAÇÃO
Lau caminha
pelas ruas do bairro, onde vive desde 1.954, como quem conhece cada palmo de
chão. E por justamente estar familiarizado com o lugar que notou o
desaparecimento das abelhas. Não foi preciso ir longe para descobrir a causa da
mortandade: várias espatódeas, plantadas no entorno da Escola “Prof. Antônio
Gomes de Oliveira”, com suas flores de cores fortes, num misto de laranja
avermelhado, são a porta da morte para as abelhas.
“Nesta época
do ano as árvores quase não têm flores. Sem alimento, as abelhas vão atrás do
néctar das espatódeas e morrem”, afirmou o apicultor mostrando várias flores
murchas onde podem ser vistas as abelhas em decomposição em seu interior.
“A
Prefeitura precisa erradicar essas árvores. Não é possível manter as espatódeas
que envenenam os insetos”, acrescentou Lau, comentando que “um tempo atrás
andaram cortando as espatódeas pela cidade. Mas, não tiraram todas, como se vê
aqui no bairro. É preciso fazer alguma coisa urgente”.
Consultado
sobre o assunto, o secretário municipal do Meio-Ambiente, Leonardo Mascarin,
afirmou não ter recebido nenhuma denúncia sobre as árvores venenosas. Mas,
assegurou que determinará a realização “de um levantamento e, se for o caso,
elaboraremos um plano de trabalho para cuidar do problema”.
FENÔNEMO
Segundo o
zootecnista Valter Eugênio Saia, da Secretaria Municipal da Agricultura, e um
dos maiores especialistas em Apicultura, o néctar das espatódeas “contém um
piretroide natural que mata os insetos. É uma forma natural de a planta
garantir matéria orgânica com os restos dos insetos que funcionam como adubo.
Agora, não é comum matar abelhas. Sabe-se da morte de vespas e marimbondos”.
O
especialista ponderou que uma das causas desse fenômeno talvez seja o excesso
de chuva das últimas semanas. “Como choveu bastante e lavou o néctar das
flores, as abelhas podem ter ficado sem opção e procurado as espatódeas. As
abelhas da região urbana têm dificuldade de encontrar uma fonte de néctar
saudável”.
Enquanto o
fenômeno não é totalmente esclarecido, resta ao Lau improvisar para garantir a
vida dos poucos enxames que mantém em casa: ele está colocando mel nas colmeias
para impedir que as abelhas voem longe em busca de alimento. “Seria o voo de
morte!”, finalizou.
Reportagem publicada na edição de 09.06.2013
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