A voz do
povo é a voz de Deus, dizem os mais antigos. E eles têm razão. Um bom exemplo
foi a contribuição dada pela população na elaboração do Plano Diretor do
Município, que completa seis anos no mês que vem. Das reuniões no campo e na
cidade saíram os subsídios norteadores do documento que deveria embasar o
desenvolvimento sustentável de Marília. O que se viu, entretanto, foi o pouco
aproveitamento de um plano que necessita de profunda revisão e de leis
complementares. Em resumo: um desafio ao próximo governo municipal.
Laerte Rosseto |
A análise é
do arquiteto Laerte Rojo Rosseto, mestre em Urbanismo, com 40 anos de
profissão, ex-secretário de Planejamento Urbano da Prefeitura por três vezes,
além de vereador nos anos 90. Considerado um dos maiores especialistas da área,
ele esteve à frente da equipe que trabalhou na elaboração do Plano Diretor de
Marília, premiado como um dos cinco melhores do Estado de São Paulo.
Se na década
de 70 as cidades compravam pronto o Plano Diretor apenas para cumprirem uma
exigência legal e terem acesso às verbas federais, com a criação do Ministério
das Cidades a coisa mudou de figura. Todos os municípios com mais de 30 mil
habitantes foram obrigados a colocarem a mão na massa, levantarem prioridades e
elaborarem um documento que disciplinaria o desenvolvimento dos municípios, de
modo organizado.
O Plano
Diretor de Marília, aprovado pela Câmara Municipal através da Lei
Complementar 480, de 09 de outubro de
2.006, destaca, logo no primeiro capítulo, os princípios do documento: “Respeito
às funções sociais da cidade; Respeito às funções sociais da propriedade;
Desenvolvimento sustentável; Gestão democrática e participativa da sociedade civil
organizada e Respeito ao princípio da supremacia do interesse público sobre o
particular”.
Mobilidade urbana: trânsito caótico é um dos principais problemas; (Foto Alexandre de Souza/Correio Mariliense) |
PLANEJAMENTO
Entre as
inúmeras sugestões, a coleta seletiva e o plano de arborização urbana foram
unanimidade nas assembleias. Também foram pleiteados investimentos em espaços
públicos como praças e áreas de lazer, construção de feiródromo, ciclovias etc.
“É preciso entender o que a população quer, tudo a partir do trabalho que já
foi feito porque não se deve voltar atrás. Tem que aprimorar, aperfeiçoar o
Plano Diretor que é uma pedra que precisa ser lapidada”, afirmou o arquiteto.
População opinou no campo e na cidade |
Segundo ele,
a questão da mobilidade urbana é um dos grandes problemas de Marília, a exemplo
das demais cidades de porte médio. As alternativas passam pelo Plano Diretor no
sentido de “se rediscutir o plano viário e a criação de estímulo a novas
centralidades”, sem esquecer as prioridades de sempre, como educação e saúde.
Laerte
Rosseto afirmou que devem ser fortalecidos os Conselhos Municipais, que
representam a população, e também a equipe técnica da administração municipal.
Ele contou que visitou Uberaba (MG) onde existe um setor com mais de 200
profissionais tratando da questão da mobilidade urbana. “Dentro da Prefeitura
tem que criar um espaço de Mobilidade, uma secretaria à parte que cuide do
assunto, como a implantação de ciclovias, passeios, calçadas etc”, acrescentou.
Defendendo a
importância da participação popular, Laerte Rosseto lembrou que nas audiências
públicas “a gente não sabia que o pessoal dos bairros conhecia tanto. Eles
sabem de coisas que nem imaginamos. Por exemplo, teve o caso de uma trilha, no
meio do mato, que as pessoas cortam caminho passando por um córrego até uma
escola. Só quem sabe disso é o morador de lá. Isso é desconhecido do poder
público. Com isso fomos enriquecendo o Plano Diretor”.
Itambé: plano previu preservação e exploração turística. (Foto Ivan Evangelista) |
Ele citou, também,
a implantação das “Vias Verdes” na periferia: “Ninguém sabe o que é isso. As
vias verdes ligariam uma escola a outra, com arborização no caminho, ciclovia
etc. Assim, se uma criança se perdesse no caminho para sua escola, saberia que
seguindo a ‘Via Verde’ chegaria até a outra escola na ponta”.
Área de preservação permanente na zona norte |
“O Plano
Diretor está cheio de detalhes, de coisas a serem resolvidas. Se forem
aplicados 50% do que foi previsto a cidade ficaria uma maravilha”, acrescentou
o arquiteto que lamenta o fato da implantação do plano não ter avançado: “Na
época da apresentação na Câmara Municipal fui taxado de comunista que estaria
fazendo a reforma urbana”, pontuou, revelando ter tido grandes embates com os
interesses do setor imobiliário.
PARQUE DOS ITAMBÉS
Com muitas
ideias fervilhando, Laerte Rosseto observou que Marília tem todas as condições
para se desenvolver com qualidade de vida para a população. Ele lembrou do
Parque dos Itambés que está previsto no Plano Diretor e que seria um importante
incremento para o turismo ambiental: “Já pensou um tour de ônibus com teto de
vidro, passando pelos parques e Itambés, aos domingos?”
A questão da
ciclovia, na opinião do arquiteto, poderia ser facilmente resolvida com a
utilização da faixa ao lado da estrada de ferro que corta a cidade de norte a
sul. Por ser um terreno plano, seria perfeito para o deslocamento de bicicleta
tanto dos trabalhadores como de toda a população. Ele assinalou que “como Marília
é fragmentada pela ferrovia, Rodovia do contorno e pelos itambés, está na hora
de pensar na regionalização criando novas centralidades fora do centro
comercial, para facilitar a mobilidade e a qualidade de vida da população”.
Faltando uma
semana para a eleição, Laerte Rosseto disse acreditar que o próximo prefeito
poderá fazer a diferença pensando em Marília com todas as suas potencialidades
e necessidades tão bem apresentadas pela comunidade. “Ele terá o grande desafio
de tirar do papel a cidade dos sonhos dos marilienses”, finalizou.
* Reportagem publicada na edição de 30.09.2012 do Correio Mariliense