sexta-feira, 5 de junho de 2015

Para sobreviver, Associação Amor de Mãe reduz atendimento das crianças em 57% e foca na sustentabilidade econômica.

Por Célia Ribeiro

No fim de 2014, o cenário sombrio vislumbrado pelos analistas econômicos alertava que o ano de 2015 seria de muitos desafios. Para uma instituição filantrópica, cravada na periferia de Marília/SP e acostumada a todo tipo de dificuldade, este seria mais um ano de trabalho duro para fechar as contas. Só que não. Quando janeiro chegou, a Associação Amor de Mãe se viu diante de um dilema que a obrigou a adotar medidas drásticas para continuar de pé, como a redução de 140 para 60 no número de crianças assistidas.

Hora de brincar: crise reduziu as vagas
Criada há 08 anos a partir do trabalho social da Pastoral da Criança da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, a Associação Amor de Mãe é uma das mais sérias instituições filantrópicas de Marília. Fundada e dirigida pela professora voluntária Tammy Regina Gripa e sua mãe, Marluci Silva Gripa, a entidade goza de tanta credibilidade que possui dezenas de parceiros e apoiadores na iniciativa privada e entre entidades de classe, universidades e clubes de serviço.

A Prefeitura colabora com a doação de alimentos para o preparo de refeições e cede recursos humanos. No entanto, para manter o atendimento às crianças da zona oeste, sobretudo do Jardim Califórnia e adjacências, a instituição promove eventos (jantares, bazares e feiras de sobremesa) e investe em projetos de geração de renda para garantir sua sustentabilidade econômica.
 
Muito profissionalismo marca o atendimento da entidade
A padaria industrial, construída e equipada pelo Supermercado Tauste, produz uma grande variedade de produtos (pães, roscas, salgados etc) que são comercializados em bancas no final das missas da Igreja Santa Izabel (sábado à noite) e Paróquia Santa Clara (domingo pela manhã), além de receber encomendas com entrega em domicílio.

Caixa zerado

Tammy Gripa: luta diária 
“Quando janeiro chegou, não tinha nada em caixa. Tínhamos muitos débitos e não sabíamos o que fazer. Mesmo com as crianças em férias, as dívidas continuavam, como encargos com funcionários, água e luz”, recordou Tammy Gripa. Sem saída, ela partiu para a única opção disponível: “Desesperada, fiz um empréstimo pessoal e paguei as dívidas”, contou, explicando que o fôlego provisório deu um alívio para virar o jogo.

“Comecei a correr atrás de novos projetos e inscrevi um no Banco do Brasil. Felizmente, ele foi aprovado e a verba veio em março, R$ 5.600,00 por mês, até o fim do ano, para pagamento de funcionários, psicopedagoga, psicóloga, assistente social e mais um professor”, informou a diretora.
 
Refeições equilibradas são servidas diariamente
O projeto apoiado pelo Banco do Brasil previa o atendimento de apenas 60 crianças, selecionadas entre as que apresentassem dificuldades de aprendizado e estivessem em situação de risco, além de pertencerem a famílias de baixíssima renda. Neste novo cenário, a Associação Amor de Mãe precisou reduzir de 140 para 60 o número de atendidos, além de suspender as oficinas (de violão, flauta, balé, artesanato etc) que espera retomar futuramente.

Oficinas de música, como a de violão, foram suspensas
“O projeto é para crianças que têm problemas, com pais separados, cuidadas pelas avós, que têm pais presos ou drogados, ou têm transtornos na escola e ninguém consegue fazer nada. Esses problemas gritantes é que estamos trabalhando este ano”, explicou Tammy. Ela contou que “em fevereiro, no início das aulas, reuni todos os pais e dissemos que não teria mais as oficinas e iríamos fazer a seleção para crianças de 05 a 11 anos: quem mora na região Oeste e tem renda de até dois salários mínimos”.

A entidade sempre atuou em duas frentes: desenvolvendo projetos de geração de renda para as famílias e a assistência às crianças que frequentam o local no contra turno da escola. Lá, fazem as tarefas escolares com acompanhamento, recebem alimentação e, antes das mudanças, também participavam de oficinas culturais.

Cadê as bailarinas? Meninas sonham com as aulas de balé.
Com uma estrutura bem montada, a Associação Amor de Mãe segue buscando alternativas para ampliar a arrecadação e formar mão de obra entre as mulheres desempregadas que desejam aprender um ofício. Neste sentido, o curso de salgados ministrado em parceria com a FATEC, em maio, capacitou as mulheres que perderam o emprego na crise econômica. Com inscrições gratuitas, o curso recebeu doação da matéria prima do Leilão Solidário.

Bolsas artesanais

Aproveitando as instalações da sala de costura, a instituição está produzindo, em caráter experimental, bolsas com tecidos de mostruários de estofados doados pelas empresas. As peças estão sendo comercializadas para ajudarem na manutenção da entidade, assinalou Tammy Gripa.

Confecção de bolsas para
geração de renda
“Todos os dias fazemos alguma coisa para sobreviver. Na Japan Fest, onde fomos muito bem acolhidos, fizemos pão de mel que renderam mil reais e ajudaram a pagar as contas de água e luz. No Esmeralda Shopping, nossa feira da sobremesa rendeu 600 reais e assim vamos em frente”, comentou a diretora.

Na agenda, estão marcados uma feira da sobremesa no Tauste Norte (dia 06/06) e o I Baile Jantar do Dia dos Namorados (dia 12/06) no Alves Hotel, a 35 reais o valor do ingresso individual.

Quanto à retomada das atividades, Tammy espera voltar aos poucos com as oficinas “porque as crianças, sem terem o que fazer, ficam na frente da televisão”. Uma das que mais sentiu a desativação foi a de balé. Ela recordou a apresentação das meninas, no final de 2013, no Teatro do Colégio Sagrado Coração: “Foi emocionante e muito lindo. Fazer balé é sonho de uma criança rica e não de uma criança pobre. Essas crianças não podem sonhar mais porque precisaríamos de um patrocinador”, pontuou.
 
Bruna e Yasmin
Uma das mais ansiosas pela volta das aulas de balé é Yasmim Tainara, nove anos, moradora do Jardim Califórnia. “Ela se destacou muito e até recebeu um prêmio por sua dedicação”, revelou Tammy Gripa. A menina disse que o balé a ajudou muito na parte de disciplina e organização: “Quero muito que volte logo”, disse. Ao seu lado, Bruna Pereira, 12 anos, contou que gostava das aulas de balé porque a atividade a ajudou a perder um pouco da timidez.

Aprendendo com a dor
 
Delícias da padaria
“Não podemos perder tempo porque já sofremos muito”, assinalou Tammy Gripa que já está elaborando projetos para 2016. “Aprendemos muito com o sofrimento do ano passado. E hoje aprendemos com quem realmente sofre. Sofrem essas crianças que nem se imagina. Tenho vítimas de violência sexual, tenho vítimas de drogas, de criança que foi gestada com os pais no auge do crack”, desabafou.


Padaria profissional, construída e equipada pelo Tauste.
A mudança no perfil dos assistidos, pelo visto, veio reforçar a determinação da instituição em manter-se de pé, apesar de todas as dificuldades, procurando alternativas de geração de renda para voltar a atender a clientela especial que tanto necessita desse apoio.

Para encomendar pães, salgados (quibe, coxinha, rissoles, bolinhas de queijo) a partir de cinco reais a bandeja e outras delícias, telefone para: (14) 3422.5525.

Para saber mais, Marília Sustentável publicou outras reportagens sobre a entidade que você confere clicando nas datas: 2010, 2011 e 2013.
 Obs: Imagens de atividades são do arquivo da instituição