domingo, 25 de março de 2018

NAS TARDES DO GACCH, ARTESANATO UNE MÃES DE CRIANÇAS EM TRATAMENTO.

Por Célia Ribeiro

Em meio ao colorido dos fios de lã, barbante ou malha, mãos habilidosas executam movimentos cadenciados com a agulha de crochê. Aos poucos, o que era um esboço no caderninho de anotações materializa-se em delicados trabalhos que, para grande parte dessas artesãs, tornou-se importante fonte de renda. Elas formam um grupo muito especial: são mães de crianças em tratamento que se reúnem, nas tardes de terça-feira, no GACCH (Grupo de Apoio às Crianças com Câncer e Hemopatias), em Marília.
Silza: voluntária foi aprender crochê para ensinar
Voluntária há 12 anos na instituição, Silza Más Rosa lidera o grupo das terças. Ela é uma das mais de 50 voluntárias que, diariamente, desenvolvem algum tipo de atividade voltada para as crianças e suas famílias. O GACCH, que conquistou sede própria após uma grande ação apoiada pelo Panetone Solidário do Tauste, existe há 15 anos e é reconhecido por sua importância no acolhimento a milhares de pessoas, vindas de 62 municípios da região, que ali encontram um porto seguro.
Um dos quartos do GACCH: hospedagem para quem vem de longe
Denominado “Projeto Conviver”, as oficinas de arte movimentam a instituição. No início da tarde, as primeiras mães começam a chegar com os filhos que são recebidos com alegria pelas voluntárias. Há espaço para brincar, leitura, jogos e, claro, um delicioso lanche preparado com carinho pela equipe da cozinha. Na última terça-feira havia pãezinhos recheados de presunto e queijo e vários bolos servidos com café.

GERAÇÃO DE RENDA
Bolsa em fio de malha: sucesso que gera renda
“A Casa de Apoio foi criada para dar assistência às crianças e famílias que vêm de fora para tratamento. Mas, nossa casa é diferenciada nisso. O projeto que coordeno é para dar assistência às mães que moram em Marília”, explicou Silza Más Rosa. Ela continuou citando que “o objetivo é tira-las de casa um dia por semana, pelo menos, porque aqui elas encontram seus pares, são mães que passam pelos mesmos problemas e que juntas se fortalecem”.
Marlei (1ª esq) tem filha e neto com anemia falciforme
Além disso, prosseguiu a voluntária, “é uma oportunidade para tomarem um bom lanche, deixarem as crianças brincando porque temos sempre alguém para cuidar delas, passando uma tarde legal”. E as incursões pelo artesanato deram tão certo que, como frisa a coordenadora, “é uma brincadeira que pode se tornar uma brincadeira rentável” em um projeto de geração de renda.
Ângela perdeu o filho e continua no GACCH apoiando outras mães
Segundo a assistente social Ieda Santos Silva, poucas mães conseguem o benefício do INSS (Prestação Continuada da LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social) que garante um salário mínimo por mês. Elas não podem trabalhar porque os filhos muitas vezes são hospitalizados, estão fazendo quimioterapia ou submetidos a exames, e através do artesanato conseguem confeccionar produtos de fácil comercialização.
Roupas em ótimo estado são doadas

Um exemplo é a dona de casa Ângela Maria da Silva, 41 anos, sete filhos e três netos. Ela perdeu um filho há três anos e não cortou o vínculo com o GACCH. Através do artesanato ela conseguiu colocar piso na casa em que vive com a numerosa família no bairro Figueirinha. Na última terça-feira, manifestando a solidariedade própria daquelas que enfrentam o mesmo drama, Ângela pediu autorização para levar material a uma das mães. “Ela não está legal e por isso não veio. Vou lá dar uma força”, confidenciou.

Ela contou que há muitos anos frequenta a entidade e que recebeu muito apoio nos momentos finais do filho: “Ele passou por tanta coisa e não resistiu. Mas, temos que erguer a cabeça e lutar até o fim. Tem que colocar na mão de Deus”. Agora, se dedica a apoiar outras mães enquanto se aperfeiçoa nos trabalhos manuais.

TRISTE REALIDADE

Uma das frequentadoras mais antigas do GACCH é Marlei Cristiane da Cruz, moradora do CDHU, na zona sul de Marília. Ela tem uma filha de 16 anos portadora de anemia falciforme e frequenta a instituição há 15 anos. Recentemente, descobriu que o neto Giovane, filho da filha Jéssica, também é portador da doença.

Tardes alegres: crianças são recebidas pela voluntária
Ela elogiou o acolhimento da instituição que assiste as famílias em suas necessidades mais urgentes: para quem vem de fora, hospedagem e alimentação, e para todos que têm crianças em tratamento de câncer e hemopatias (doenças do sangue), leite, complementos, sondas, medicamentos que não se encontra na rede pública de saúde, cestas básicas etc.
Voluntária finaliza pintura na parede: cores para alegrar o ambiente
A importância do apoio às famílias é um combustível do voluntariado da entidade: “A gente vê crianças que chegam cedinho ao HC, ao Hemocentro, para fazerem exame de sangue ou a quimioterapia e precisam ficar horas esperando a condução para levá-los de volta às suas cidades. Para isso temos o GACCH: eles tomam um banhinho, descansam, dormem, tomam o lanche, brincam e ficam aqui até a hora de irem embora”, observou Silza Más Rosa.
No quintal, muitos brinquedos recebidos em doação fazem a festa das crianças

"Supla" está na moda
A coordenadora do artesanato das terças assinalou que “as mães que se reúnem no GACCH viraram uma grande família, com uma batizando o filho da outra. Temos muitas comadres aqui”, disse sorrindo. A união do grupo é visível na pausa para a prece, às 15h, antes do lanche coletivo. De mãos dadas, uma delas comanda a oração que pede saúde e bênçãos aos que precisam, seguida do Pai Nosso e da Ave Maria.
Detalhe em um dos quartos: carinho

Com uma energia contagiante, Silza Más Rosa está sempre se impondo novos desafios: ela foi aprender crochê para poder ensinar e, agora que até cria receitas elaboradas, quer empoderar as alunas. “Queremos usar a internet ao nosso favor. Já temos algumas mães com páginas na internet vendendo seus produtos. Elas precisam ganhar asas e voar”.  E, enquanto alçam voos cada vez mais altos, essas mães criativas sabem que podem ir longe e voltarem ao ninho: toda terça tem lãs e linhas coloridas, café quentinho e muito amor e solidariedade à espera de todas!

FONTE DE RENDA 

Localizado à Rua Julio Mesquita, 50 (perto da Santa Casa) , o GACCH é mantido com eventos beneficentes e doações da comunidade, empresas e clubes de serviço. A próxima promoção é a 4ª Festa da Pizza, ao preço de 22 reais a unidade, que pode ser encomendada pelo telefone da instituição (14 – 3422.4111). Além disso, são produzidas sob encomenda várias delícias como esfirras, pães, tortas, palitinhos de pimenta etc e um bazar permanente, na entrada da entidade, com artesanato e vários produtos garante uma parte importante
do custeio.
Para ajudar, ligue: (14) 34224111


domingo, 18 de março de 2018

Guardião da floresta: produtor agroecológico quer proteção para nascentes e cachoeiras no entorno de Marília

Célia Ribeiro

As passadas largas, com os pés descalços desviando dos galhos, convidam ao passeio pela floresta onde o visitante se encanta com a variedade de espécies exóticas. A poucos quilômetros de Marília, no Distrito de Padre Nóbrega, o refúgio formado pelo produtor agroecológico José Antonio Nigro se funde a outro paraíso: o das nascentes e cachoeiras do entorno que ele sonha ver preservadas para as futuras gerações.
Cachoeira no entorno de Marília: natureza ameaçada
Conhecido pelas pimentas, ervas aromáticas, compotas, licores e uma infinidade de produtos que saem da propriedade diretamente para as feiras orgânicas, restaurantes e consumidores fieis, Nigro é um homem do mato. Mas, também, é um homem de forno e fogão. “Nasci cozinheiro”, costuma brincar ao explicar a paixão pela boa mesa.
Todos os espaços são aproveitados para produção de mudas
Por isso, zelar pela matéria prima de seus pratos passou pelo investimento na produção própria dos temperos, ervas aromáticas, frutas, legumes e verduras. Na chácara que divide com a mãe, dona Geni, a recepção é sempre calorosa. Não faltam um delicioso bolo de milho assado na hora e um cafezinho para perfumar o ambiente.

Nigro e o pilão que fez para socar temperos
Antes, porém, é preciso deixar a preguiça de lado e percorrer a propriedade enquanto ele explica, como um professor dedicado, o nome, a origem e a utilidade de cada planta. “Temos mais de 80 tipos de ervas e pimentas e 60 variedades de frutas como cajá-manga, cajá, umbu, açaí, tomate andino, cereja, caqui, seriguela, manga, abacate, maracujá etc”, revela enquanto colhe um fruto aqui e outro ali deliciando-se ao prova-los.

As galinhas espalhadas pela propriedade disputam o acesso aos canteiros bem cuidados que Nigro protege com telas: “Soltamos as galinhas e prendemos as plantas”, brinca. Os temperos são um caso à parte: uma infinidade de opções para dar sabor e aroma às preparações dos cozinheiros mais exigentes. “Orégano, sálvia, menta, manjericão, araruta, açafrão, hibisco, arnica e todo tipo de erva que se possa imaginar eu plantei aqui porque não uso tempero pronto ou conservantes. Minha cozinha é natural”, faz questão de frisar.

EXPERIÊNCIA

Definindo-se como homem do mato, Nigro  mostrou sua flexibilidade ao trocar a terra firme pelo mar. Viveu a experiência de cozinhar em plataforma de petróleo durante o período de dois anos que viveu no Nordeste: “Trabalhava 14 dias embarcado e 14 dias em terra. Quando cheguei lá, joguei fora tudo o que era tempero pronto. Levei meus temperos, minhas ervas e o pessoal adorou. Quando fui embora eles sentiram muito e também senti porque foi uma experiência incrível”, revelou.
Dezenas de espécies presentes neste pequeno paraíso
Realizado por morar cercado de verde e lidar com a terra, o agroecologista confessa que “não aguentaria morar na cidade ou em apartamento. Se me tirar do mato, por três dias, acho que morrerei”. Atualmente, ele divide o tempo com o cuidado da horta e pomar, a produção de conservas e licores e a cozinha dos eventos em que é contratado para festas e reuniões”.
A caminho do paraíso

CACHOEIRAS E NASCENTES

Como seu dia começa bem cedo, Nigro tem tempo para explorar o entorno fazendo incursões na Área de Preservação Ambiental (APP) das imediações. E foi justamente nessas andanças que ele se deparou com as agressões ao meio-ambiente: muito lixo deixado por quem frequenta a cachoeira localizada nos fundos de um condomínio residencial.
Água cristalina direto da fonte
Sacos de lixo, latas e plástico e até restos de roupas são deixados pelo caminho: “Dá muita tristeza ver como a cidade avançou e as pessoas não têm consciência da importância da gente cuidar e preservar isso aqui. Como será para nossos filhos e netos?”, pergunta. Em sua opinião,  deveria haver fiscalização para impedir que se comprometam as nascentes de água.
Nigro recolhe um pedaço de madeira que se transformará em algum utensílio em casa
“Sempre que posso, venho até a cachoeira tomar um banho. Isso me devolve a energia”, contou o produtor que também recolhe o lixo que encontra pelo caminho. Mesmo sendo um local cujo acesso não é tão fácil, muitas pessoas descobriram esse paraíso e para lá se dirigem esquecendo de recolher latas, vidros, plásticos e todo lixo produzido.
Lixo deixado por visitantes
Nigro revela o sonho de um dia ver o local preservado e disponibilizado para a comunidade de maneira organizada. “Marília tem muitas coisas bonitas, muitos locais que poderiam atrair turismo. Mas, de qualquer jeito, isso não vai funcionar porque podem destruir uma coisa linda que é a natureza”, concluiu. Para falar com o produtor, o contato é: (14) 99803-2327.

PREFEITURA EXPLICA AÇÕES PARA PROTEÇÃO AMBIENTAL 

A Secretaria do Meio Ambiente e de Limpeza Pública, através da Divisão do Meio Ambiente, informou que está sendo realizado o cadastramento de todas as nascentes de Marília, incluindo os seis distritos e a Fazenda do Estado. Além disso, destacou o “trabalho de preservação, com cercamento das áreas e plantio de mata ciliar, no intuito de cuidar desse bem tão precioso e cada vez mais escasso, que é a água”.
Prefeitura está plantando 30 mil mudas (Foto: Assessoria de Imprensa)
Por se tratar de um trabalho de longa duração, realizado com vistorias bairro a bairro, os trabalhos ainda se encontram em fase de desenvolvimento: “Quando identificada a nascente, a mesma passa por um registro fotográfico, identificação de sua localização com as devidas coordenadas (UTM) e inicia-se o projeto para cercamento e plantio”.

A nível estadual, a Prefeitura de Marília participa do “Projeto Nascentes” onde está em busca de recursos para expansão da preservação de áreas verdes do município, aliando a conservação de recursos hídricos à proteção da biodiversidade”. Informações na internet:  http://www.ambiente.sp.gov.br/programanascentes/.
Mudas preparadas

Por fim, esclarece que “esta secretaria vem reflorestando e recuperando o córrego Caingangue, um importante afluente do rio Aguapeí. Com projeto para plantio de 30 mil árvores, esta recuperação de mata ciliar dá início aos trabalhos de  identificação e preservação de todos os recursos hídricos do município, servindo como modelo para preservação das demais nascentes”

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

A Prefeitura informou que “também são realizadas palestras educacionais aos alunos das EMEIs e EMEFs do município, através do Centro de Educação Ambiental, localizado no Bosque Municipal, no intuito de desenvolver a consciência ambiental desde cedo em nossos pequenos cidadãos”. Na próxima semana, de 19 a 23, o Bosque Municipal receberá as escolas devidamente agendadas, nos períodos da manhã e tarde em comemoração ao 22 de março, Dia Mundial da Água.

Os moradores que desejarem colaborar com a preservação das nascentes em seus bairros, deverão entrar em contato com a Prefeitura Municipal de Marília, através do telefone 3454-3400, e falar com Cassiano Rodrigues Leite, Chefe da Divisão do Meio Ambiente, informando a localização da nascente para a devida identificação e cadastramento e posterior preservação com cercamento e plantio de mata ciliar.


domingo, 11 de março de 2018

A CASA DAS SETE MULHERES: O EXEMPLO DE SUPERAÇÃO NA LAVANDERIA COMUNITÁRIA.

Célia Ribeiro

Pouco antes do meio-dia, com o sol a pino amolecendo o asfalto irregular do pátio, mal dava para sentir a leve brisa envolvendo as roupas no varal. Em uma espécie de balé descompassado, dezenas de roupas coloridas balançavam nos varais espalhados pelo terreno. Traziam, ao menos naquele instante, um pouco de esperança: o tempo bom e o calor são amigos de quem depende do clima para sobreviver. Entretanto, escondiam a angústia de quem enfrenta perdas diárias e segue adiante.
Roupas secam sob sol forte
Um dos principais e mais antigos projetos sociais da cidade, a Lavanderia Comunitária da Associação de Moradores do Nova Marília, localizada em frente à Paróquia de Santa Rita de Cássia, na Zona Sul, sobrevive pela perseverança de um grupo de mulheres encabeçado pela líder comunitária Laudite Ferreira Gaia Vieira.
Aparecida Fátima é uma das mais antigas
Na semana em que se comemora o “Dia Internacional da Mulher”, esse pequeno grupo ilustra a força e determinação das mulheres para encararem os desafios, sofrerem derrotas, levantarem e começarem tudo de novo. A lavanderia chegou a abrigar nove mulheres, mas apenas sete puderam permanecer porque o movimento caiu, as despesas aumentaram e os auxílios minguaram.
Nos tanques, as roupas que serão lavadas manualmente
Se nos bons tempos a lavanderia registrava um movimento de 700 a 750 quilos de roupa por semana, o número caiu quase pela metade. Atualmente, as trabalhadoras lavam e passam cerca de 450 quilos semanais. Sinal da crise econômica que atingiu o projeto duplamente: de um lado, encarecendo os insumos (materiais de limpeza, energia elétrica etc) e de outro, diminuindo a freguesia.

Embora localizado em uma região populosa, que cresce a cada dia, o projeto iniciado na década de 80 sente o peso das adversidades. Além da queda no movimento, as três máquinas (lava e seca), doadas pelo Rotary Club de Marília Leste e Empresa Mariferro, em 2014, estão paradas esperando reparos.

Máquinas (lava e seca) paradas por falta de dinheiro para os reparos
“Foi uma benção quando recebemos a doação. A gente deixou de lavar tudo na mão e passamos a usar as máquinas. Com o tempo, elas começaram a quebrar, sempre na parte do automático, e a gente ia arrumando conforme tinha condições. Mas, agora, estamos com as três paradas e sem dinheiro para o conserto que fica entre 400 e 500 reais cada uma”, relatou a presidente da Associação e coordenadora da Lavanderia, Laudite Vieira.
Ex-vereadores Capacete e Bássiga com o ex-presidente Nardi
Na época, meados de 2.014, a lavanderia foi beneficiada pelo trabalho da Câmara Municipal de Marília, na gestão do presidente Luiz Eduardo Nardi, que fomentou o apoio da iniciativa privada e clubes de serviço aos projetos sociais. O Rotary Marília Leste abraçou a causa e apoiou a lavanderia doando duas lavadoras e a Mariferro doou o terceiro equipamento.

MUITAS PERDAS

Com os olhos marejados fitando ao longe, dona Laudite conta que muitas coisas mudaram em quatro anos. Vários diretores da Associação do Nova Marília faleceram, entre os quais o grande incentivador da lavanderia, Valmir Farias. Outra morte muito sentida foi da dona Ana, que liderava a equipe, sem falar na voluntária Carmen Jorente que, perto dos 80 anos, cozinhava no local e que também faleceu.
Dona Laudite e o cliente fiel Sr. Odair

A rotina das sete mulheres é exaustiva: chegam com o amanhecer, por volta de 6 horas, tomam café, geralmente preparado pela dona Laudite, e iniciam o trabalho que só termina no fim da tarde. Lavam e passam roupas, edredons, cortinas e tapetes com preços acessíveis. O quilo da roupa comum sai por R$ 7,50 e de tapetes a R$ 9,00.

A clientela é eclética. Tem gente da redondeza, mas muitos percorrem muitos quilômetros vindos de outras regiões da cidade com o carro abarrotado de roupas que são pesadas e separadas, com muito cuidado, à vista do freguês.

E por falar nisso, enquanto faziam uma pausa para o almoço, preparado na cozinha anexa ao salão, chegou um cliente fiel: o aposentado Odair Pintan foi logo entrando para conferir o cardápio do dia. “Ele é de casa”, disse dona Laudite, abrindo um sorriso amigável. E o aposentado continuou o tom informal afirmando que “o serviço daqui é tão ruim que nunca parei de vir. E lá se vão nove anos”.

SOBREVIVENDO

Como a maior parte das famílias tem feito para equilibrar o orçamento, a coordenadora da lavanderia também se esforça para manter as contas em dia. Cada uma das mulheres participantes do projeto recebe um salário mínimo por mês. Meticulosa, dona Laudite ressalta que também é recolhido o INSS de todas para garantir a aposentadoria e o amparo da Previdência Social em uma emergência, como um problema de saúde.

Além da redução no volume de serviço, a lavanderia sofre os reflexos da interrupção da ajuda que vinha da Paróquia Santa Rita de Cássia. Parte do dízimo doado pela comunidade à igreja era revertida para o projeto. “Cortaram tudo, cortaram o vínculo”, contou, sem esconder a tristeza.
Dona Carmen Jorente: voluntária que faleceu e deixou saudade
A obra foi criada pela Irmã Dilma Lopes Coutinho, cuja fotografia continua em lugar de destaque na lavanderia. Desde o início do projeto, segundo dona Laudite, contava com o apoio da Paróquia que também contribuía com a panificadora que funciona no local e que produz pães e roscas para venda à comunidade toda sexta-feira.

“Hoje, temos quatro voluntárias na panificadora. Continuamos fazendo e vendendo os pães e o dinheiro ajuda a mantermos a lavanderia. Tem época em que a lavanderia vai melhor e daí ajudamos na panificação. E assim nós vamos levando”, explicou.

Ela reclamou do aumento de preços de uma maneira geral: apesar da lavagem manual, por falta das máquinas que estão paradas, ainda se gasta muito com energia elétrica para passar roupa. Também é preciso repor os ferros a vapor que, com o tempo, não resistem ao volume de trabalho. “Tem mês que dá para comprar um ferro. Tem mês que não sobra nada”, acrescentou.
Os pães são vendidos às sextas-feiras e geram renda para o projeto
Outra dificuldade é com a alimentação: o dinheiro da lavanderia também é usado para aquisição dos alimentos servidos no almoço. Sempre tem voluntárias para preparar as refeições simples, mas feitas com carinho, para que as trabalhadoras não precisem parar o serviço. O difícil é arcar com os custos porque elas não recebem doações de alimentos.

Uma das integrantes mais antigas do projeto, Aparecida Fátima Ferreira, mãe de três filhos, sente-se grata por ter uma oportunidade que muitas mulheres do bairro não conseguiram. A fila de espera é grande e novas vagas somente são abertas quando o movimento aumenta e se consolida. “Gosto muito daqui porque com esse trabalho sustento minha família”, disse.

A lavanderia depende do tempo: porque não tem secadoras em funcionamento
INVERNO

Sem as secadoras em funcionamento, uma nova preocupação da coordenadora da lavanderia é com a aproximação do outono/inverno. “No tempo frio fica muito difícil secar as roupas. Temos que estender tudo aqui dentro do salão quando chove. Por isso, vamos fazer de tudo para consertar pelo menos uma das máquinas”, observou.

Católica fervorosa, dona Laudite tem fé em que as coisas melhorem: “Acredito que tudo que você faz confiando em Deus Ele te dá uma resposta. Ele nunca desampara seus filhos. Então, nós estamos de pé pela fé e pela graça”.
Área de trabalho na lavanderia: preocupação com o futuro
Finalizando, ela lançou o olhar para as roupas balançando nos varais e confessou seu temor: “Minha maior preocupação é o dia em que eu não puder mais tocar isso aqui para dar continuidade ao projeto criado pela Irmã Dilma e que tantas famílias ajudou em todos esses anos”.

Para entrar em contato com a Lavanderia Comunitária do Nova Marília, ligue para: (14) 34176928. O endereço é Rua Nair Rosilio Gutierrez,65, em frente à Paróquia de Santa Rita de Cássia, no Nova Marília.

Clique AQUI para ler a reportagem feita em 2011 na Lavaderia e AQUI para a reportagem de 2013

domingo, 4 de março de 2018

COLETOR DE LIXO DÁ EXEMPLO COM INICIATIVA BEM SUCEDIDA DE COLETA SELETIVA.

Por Célia Ribeiro

Quando o despertador toca, com seu som estridente, pouco antes do dia clarear, ele sabe que terá pela frente um dia desafiador. Afinal, terá que cruzar Marília de um extremo ao outro, registrar o ponto às 7h e tomar a condução que o levará para os bairros da zona norte. Mas, esta é apenas a primeira etapa do longo dia de trabalho que se encerrará ao anoitecer, em meio aos resíduos descartados pela cidade. Seu nome: Ângelo Moreira. Sua profissão: coletor de lixo!
Angelo e seu pai: exemplo de cidadania
Acompanhado do pai, Valdeir Aparecido Moreira, funcionário público aposentado, o moço de 34 anos e sorriso fácil conquista pela simpatia. A dupla é responsável pelo projeto inovador chamado “Reciclart” que coleta materiais recicláveis nos bairros, na FAIP e FAEF como mostrado na reportagem passada, e ainda contribui com entidades assistenciais.

Seguindo a máxima de que “o pouco, com Deus, é muito”, o coletor e seu pai recolhem os recicláveis, separando-os corretamente para a venda que lhes garante um reforço no orçamento doméstico. O dinheiro, na faixa de R$ 1.500,00 brutos, ainda é dividido com quem precisa. A APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) já recebeu uma pequena doação da Reciclart.
Recicláveis são transportados na velha Kombi
Além disso, roupas, calçados e cobertores descartados no lixo são levados para a casa do aposentado onde a esposa “lava e passa tudo, deixando em ordem para a gente levar nas entidades”. Isso mesmo: o que muita gente joga fora, por não saber onde entregar a doação, os dois aproveitam para que outros necessitados sejam beneficiados.

A JORNADA

No fim da tarde da última terça-feira (27), Ângelo e Sr. Valdeir estavam na Praça Pau Brasil, na rotatória de acesso ao Campus Universitário (Jardim Acapulco), como de costume. Lá, enquanto recolhiam os materiais depositados pela vizinhança, contaram como tudo começou. Segundo Ângelo, o seu trabalho na Secretaria do Meio Ambiente e Limpeza Pública vai das 7 às 13h. Depois do almoço, ele mal descansa e já inicia o percurso com a velha Kombi pelos bairros cadastrados. De manhã, a missão fica a cargo do pai.
Diariamente, a dupla está nos pontos de coleta nos bairros.
O cronograma da Reciclart prevê: Jardim Itaipu, Parati, Portal do Sol e Guarujá (segunda-feira). Jardim Acapulco (terça-feira), Campus da FAIP (quarta e quinta-feira), e Jardim Novo Horizonte e São Domingos (sexta-feira). Além disso, eles recolhem os recicláveis de alguns condomínios e levam as pilhas e baterias, deixadas nos pontos móveis, para o SENAC que faz a destinação correta.

“Trabalhando na coleta de lixo eu cansei de ver quanta coisa boa as pessoas jogam fora”, relatou explicando a indignação por assistir o desperdício de tudo que poderia ajudar outras pessoas. Assim, teve a ideia da coleta seletiva que, segundo ele, recebeu o apoio do ambientalista e ex-secretário do Meio Ambiente, Ricardo Mustafá.

Ângelo afirmou que teve respaldo da Prefeitura  desde o início da atual gestão. Nos contatos fornecidos aos interessados constam seu número de celular (14 – 996648215) e o telefone da Secretaria (34086700). Ele também elogia a disposição da Prefeitura em estudar a implantação da coleta seletiva com critério “porque tem mais de 1.000 catadores na cidade e se vier uma empresa de fora muita gente vai ficar sem trabalho”, observou.
No ponto de coleta do Jardim Acapulco, aproveitaram para limpar o local.
Em contato com a Assessoria de Imprensa do prefeito Daniel Alonso, a resposta foi: “A Prefeitura de Marília, por meio da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e de Limpeza Pública, informa que os ecopontos já foram projetados e estão em processo de licitação para a implantação. A coleta seletiva será implantada no município assim que os ecopontos estiveram instalados, sendo esta a grande prioridade da Secretaria do Meio Ambiente”.

MISSÃO

Trabalhando ao ar livre (na traseira do caminhão coletor de lixo), sob sol e chuva, frio e calor insuportável, Ângelo não desanima e tem orgulho da profissão. Nem mesmo o fato de morar no bairro Nova Marília, zona sul, e trabalhar no final da Avenida República, zona norte, é capaz de diminuir seu bom humor.
Angelo e Sr. Valdeir vêem a utilidade  do que é descartado todo dia

“Cada dia é um dia. Nunca sabemos o que vamos encontrar”, disse explicando que a experiência de separar o lixo no trabalho foi útil na hora de pensar em um trabalho alternativo que ajudasse o meio-ambiente e, ao mesmo tempo, pudesse contribuir com um reforço no seu orçamento familiar assim como do pai aposentado.
Recibo de doação à APAE

“A gente vê que as pessoas estão ajudando. Tem muita gente separando os recicláveis e trazendo nos pontos móveis. Estamos divulgando bastante e quanto mais as pessoas souberem mais poderemos recolher de reciclável. Nós fazemos o trabalho e ganhamos, mas também ajudamos quem precisa e tem muitas pessoas precisando”, frisou.

No ano passado, a dupla inovou ao promover um sorteio de brindes para quem doasse os recicláveis. E, pelo visto, as ideias continuam brotando. Ângelo contou que tem planos para 2018 e agradeceu a solidariedade dos marilienses: “Vemos que quando a gente tem boa intenção, as pessoas colaboram e nós ficamos felizes porque o que pode ser útil não vai mais parar no lixão”.

RECICLÁVEIS

A Reciclart coleta plástico, latas de alumínio, papelão, óleo usado, embalagens diversas, metais, pilhas, baterias, vidro, roupas, calçados e cobertores. Os contatos são: (14) 996648215 com Ângelo e (14) 34086700 com Fabiana (recado).