domingo, 25 de fevereiro de 2018

LIXO: FACULDADE PRODUZ ADUBO, GERA RENDA E FORMA PROFISSIONAIS MAIS CONSCIENTES.

Por Célia Ribeiro

Lembrando o velho ditado de que “do boi só não se aproveita o berro”, uma instituição de ensino superior encarou um grande desafio: provar a viabilidade da adoção de práticas de sustentabilidade ambiental, seguindo o que preconiza a Política Nacional de Resíduos, investir em pesquisas e, ao mesmo tempo, contribuir para a formação de profissionais mais conscientes. E como se tudo isso não bastasse, também conseguiu gerar renda com o que seria descartado nos aterros sanitários.
Suzana em sala de aula: o envolvimento dos alunos foi fundamental
A FAIP (Faculdade de Ensino Superior do Interior Paulista), campus de Marília e a FAEF (Faculdade de Ensino Superior e Formação Integral), campus de Garça, interior de SP, implantaram o Programa de Gerenciamento de Resíduos fazendo a coleta, separação e destinação do lixo gerado nas duas instituições, tendo à frente a médica veterinária Suzana Más Rosa, detentora de mestrado e doutorado com vasta experiência na elaboração e gerenciamento de projetos na área.

Tudo começou há quatro anos, recorda Suzana: “Sou professora do curso de medicina veterinária e comecei a ficar muito incomodada em ver o lixo todo misturado, principalmente os resíduos hospitalares com o material reciclável que estava sendo desperdiçado. Como tenho experiência como consultora ambiental nessa área, escrevi um projeto e fiz a proposta para a Faculdade.”
O lixo orgânico vai para compostagem e se transforma em adubo
Receptiva, a direção do Grupo FAEF abraçou a ideia. A princípio, Suzana iniciou o treinamento com os funcionários, no campus de Garça, onde estão o curso de Medicina Veterinária e dois hospitais veterinários. “Mudamos todo o sistema de descarte, implantamos um sistema de coleta seletiva, com separação nas lixeiras e, junto com isso, determinamos os locais de armazenamento temporário desses resíduos”, explicou.

Na sequência, foi a vez da sensibilização dos alunos, docentes e coordenadores. Conforme disse, “todos os alunos de todos os cursos passam por capacitações. Fazemos um trabalho de comunicação, com informativos e vídeos publicados nas redes sociais da faculdade, para reforçar o trabalho de educação que já é feito. Tanto em Garça na FAEF, como aqui na FAIP, o Programa de Gerenciamento de Resíduos é desenvolvido através do Núcleo de Educação Ambiental (NUEMA)”.
Capacitações permanentes: funcionários recebem orientações
Como coordenadora do projeto, que se tornou um programa da instituição, Suzana contou que “paralelo ao trabalho de separação, instituído nas lixeiras, foram construídos barracões em Garça e em Marília só para armazenar os recicláveis porque é muito resíduo gerado”. No caso da cidade vizinha, os recicláveis são vendidos a uma recicladora. Em Marília, os materiais são doados para o Grupo Reciclart, formado por coletores de lixo, que percorrem os bairros a bordo de uma Kombi recolhendo o que pode ser reciclado.

NÚMEROS EXPRESSIVOS

Em três anos de programa, as instituições conseguiram recolher e destinar 20 toneladas de recicláveis que seriam descartados em aterros sanitários. Por isso, a coordenadora afirma que “o projeto de Garça serve para mostrar que é possível, que não é nenhum bicho de sete cabeças; que sirva de exemplo para outras instituições e outras empresas”.
Em três anos, 20 toneladas de recicláveis deixaram de ir para os aterros
No caso dos resíduos orgânicos, a grande surpresa: lembrando do boi, também tudo se aproveita. As sobras das cantinas e podas de árvores, além de estercos de animais vão para a compostagem e são transformados em adubo. O chorume, um grande problema porque é extremamente poluente, vira fertilizante e irriga as pastagens e campos nas duas unidades. Em Garça, o programa gera de 1.500 a 2.000 quilos de adubo por mês.

E as boas notícias não terminam aí: “Esse material ia todo misturado para o lixo comum, para o aterro. Os recicláveis vão para recicladoras e viram outros produtos; os orgânicos se transformam em adubo usado nas fazendas da instituição. No curso de agronomia e engenharia florestal, aproveitamos a experiência como fonte de pesquisa tendo sido publicados vários artigos científicos e trabalhos de conclusão de curso de alunos da agronomia com a compostagem”, observou.

ESTRATÉGIA

Uma das estratégias utilizadas foi a separação por cores: “Tudo que é reciclável vai para o saco azul e é depositado na lixeira azul; orgânico é verde e o não reciclável vai no saco preto. Então, os funcionários tiram o lixo dos setores e levam para casinhas construídas como locais de armazenamento temporário ao longo do campus. Os sacos de cores diferentes facilitam porque os funcionários já sabem o que tem em cada um. Um funcionário passa com o trator, uma vez por dia, e faz a coleta”, detalhou.
As cores ajudam a identificar o lixo: cada coisa em seu lugar
Segundo Suzana, “em Marília temos os contêineres em que são depositados os sacos de lixo. Também foi construído um barracão que terá uma estrutura de visitação para educação ambiental. A ideia é levar escolas, empresas para visitar e conhecer o trabalho como uma forma de estímulo, mesmo. Ao lado do barracão funciona a compostagem. Todo o lixo orgânico gerado durante as aulas do curso de gastronomia na Cantina, Restaurante Pedagógico e Confeitaria é transformado em adubo, que é utilizado nos campos do novo Complexo Poliesportivo do Grupo FAEFf e nos jardins do campus.

A coordenadora destacou que “tudo foi feito de acordo com a lei: o piso impermeabilizado tem canaleta para captação de chorume que é armazenado em uma caixa e depois utilizado como biofertilizante. Em Marília, o chorume é colocado em uma bomba pulverizadora para irrigar o campo de futebol. Em Garça foi adquirida uma chorumeira que é levado para o campus para irrigação das pastagens”.
Adubo orgânico e biofertilizantes, a partir do lixo, vão para plantações.
Suzana fala com visível entusiasmo dos resultados em tão pouco tempo, destacando os ganhos com a formação dos alunos, futuros profissionais: “No curso de publicidade, os alunos vão montar uma campanha com vídeos e banners para sensibilizar e conscientizar a todos sobre a importância da separação dos resíduos. Já lançamos uma campanha contra o copo descartável durante o Simpósio Científico que acontece todos os anos e periodicamente outras campanhas serão lançadas. Os alunos da engenharia civil estão trabalhando o tema gerenciamento de resíduos da construção civil, vamos envolver os alunos do curso de administração com a destinação e venda dos materiais recicláveis. A ideia é  desenvolver projetos relacionados ao assunto para cada curso. E os alunos estão se envolvendo e se engajando na causa”.

A transformação envolvendo as duas instituições salta aos olhos: “No caso dos funcionários, a gente vê uma mudança de comportamento. Os que eram resistentes, hoje são aliados. Levam o lixo reciclável de casa para a faculdade. Há alunos querendo se especializar nesta área, como duas alunas da veterinária. Uma fez TCC de Gestão de Resíduos Hospitalares usando os dados da nossa implantação. E outra está procurando curso de mestrado nesta área, fez estágio comigo e educou a família inteira que agora separa os recicláveis. Aos sábados, ela vai com o namorado em uma caminhonete para Garça levar os recicláveis”, revelou.
Lixo orgânico na composteira


Neste sentido, Suzana manifesta seu otimismo: “As pessoas mudam se você educá-las e conscientizá-las. É possível ter uma mudança de hábitos”.

FUTURAS GERAÇÕES

Com um currículo invejável, que inclui trabalhos para grandes empresas como a Petrobrás, Suzana Más Rosa tem outro bom motivo para acreditar neste projeto: o filho Kauã. “Acho muito importante servir de exemplo pro meu filho, desde as pequenas atitudes dentro de casa, separar o lixo, economizar água e envolvendo meu trabalho como professora e ambientalista”, assinalou.

Ela finalizou lembrando que seu trabalho “é cuidar do meio ambiente pensando, principalmente, nas futuras gerações. Então, meu filho está incluso neste pacote. Ele já ajuda a separar o lixo, ele acompanha meu trabalho, está sempre junto, e tem uma consciência diferenciada. É uma maneira de fazer com que isso tenha continuidade
depois dele”.

Suzana e o filho Kauã: pensando no futuro
Para saber mais sobre as instituições, acesse: www.faip.edu.br e www.faef.edu.br. O contato da Suzana Más Rosa é nuema@faip.edu.br

domingo, 18 de fevereiro de 2018

EM BUSCA DE PARCEIROS, MÉDICA QUER ZERAR FILA DE ESPERA DE PRÓTESE OCULAR.

Por Célia Ribeiro

O rosto de menina, emoldurando os olhos que sorriem facilmente, transmite paz. Mas, esconde uma força impressionante. Uma das poucas médicas especialistas em Oncologia Ocular do Estado de São Paulo, a mariliense Drª. Simone Ribeiro Araújo de Almeida, colocou para si um desafio e tanto: zerar a fila de 54 pacientes de Marília e Região que aguardam uma prótese após terem removido o globo ocular.
Drª Simone em casa: momento de descontração
Esses pacientes, incluindo seis crianças, convivem com a espera de uma boa notícia, alguns há quase seis anos. Isto porque, usuários do SUS (Sistema Único de Saúde), aguardam na fila da Fundação Oncocentro da Capital, que atende o Estado inteiro, porque não têm recursos para adquirirem a prótese que lhes dará qualidade de vida.

Embora o câncer não seja o único responsável pela remoção do globo ocular --- há casos de traumas, como acidentes de trânsito ou brigas; infecções graves etc --- a doença tem uma baixa incidência. Por isso, a dificuldade de dar visibilidade aos milhares de casos silenciosos: quem tem um olho só prefere o isolamento, o recolhimento social, como se não existisse.
Pacientes recuperam a auto-estima
Mãe de quatro filhos, incluindo duas meninas que seu coração recebeu no ano passado, a Drª. Simone não aceita assistir, de braços cruzados, o sofrimento de tanta gente. Tratou de correr atrás de uma empresa para fornecer, a um custo reduzido, as próteses necessárias aos 54 da fila de espera. Foi mais além: participou de uma capacitação em São José do Rio Preto, e está apta a realizar no seu consultório, em Marília, a adaptação das próteses sem que os pacientes necessitem de encaminhamento à Capital.

RAIO DE SOL

Para o mutirão que vai devolver o colorido da vida a adultos e crianças de Marília e região, a médica explicou que serão necessários R$ 64.800,00. Este é o valor mínimo para adquirir as próteses e custear parte dos materiais para os procedimentos que serão realizados nos finais de semana. Ela acredita que, em 30 dias, será possível atender todos os casos, a maioria com cinco anos de espera.
Drª Simone na reunião com Rotary Club de Marília Pìoneiro
ao lado da presidente Angela Giovanetti Teixeira e Vice Sandra Craveiro
Sensível, ela observa que o caso das crianças chama mais atenção. “Saiu na imprensa, recentemente, o menino que tinha um olho só e sofria bullying na escola. Um dia, não aguentava mais ser chamado de caolho, agrediu um colega de escola até matá-lo”. A médica coleciona histórias de antes e depois de pacientes que tiveram um ganho expressivo na qualidade de vida com a prótese.
Há vários tipos de prótese no mercado
(Foto: Reprodução Internet)

Um dos casos foi de uma jovem muito bonita e vaidosa que, após a remoção do globo ocular, entrou em depressão, desenvolveu anorexia, não comia mais, emagreceu 20 quilos em dois meses e precisou ser hospitalizada. Ela relatou que em contato com o marido orientou-o a sair do hospital direto para São Paulo para colocar a prótese que, como esperado, devolveu à paciente a vontade de viver.

A Dra. Simone contou que a Oncologia Ocular “foi meu início na Oftalmologia, minha especialidade mãe”. Ela é uma das 25 especialistas na área no Brasil. Desde 2002, ela é docente na Faculdade de Medicina de Marília (Famema), onde atende 62 municípios no Ambulatório de Oncologia Ocular. Da mesma forma, na Santa Casa de Marília, ela responde pelo ambulatório SUS da especialidade.

Convivendo com duas realidades tão distintas, uma vez que mantém seu consultório com atendimento particular e para convênios, a médica resolveu colocar em prática o sonho de oportunizar a reabilitação com prótese a quem não pode pagar: “Eu sempre tive a intenção de dar acesso ao serviço que atendo no consultório para o SUS”, afirmou, acrescentando que o Projeto Raio de Sol, que funcionará em seu consultório, é o primeiro passo.
Drª Simone com marido Dr. Marcelo
e filhos Pedro, Sara, Kele e Fernanda

“Veio a ideia de buscar parceiros para que a gente possa oferecer as próteses para esses 54 pacientes. Vou começar a adaptar em Marília as próteses da PPO, empresa de Rio Preto, que atende no Instituto dos Cegos e que desenvolveu um sistema super legal que fui lá fazer a capacitação. Conseguimos um valor de custo mais baixo e mínimo de materiais para buscarmos parceiros que financiem o projeto”, assinalou.

A médica apresentou seu projeto, inicialmente, ao Rotary Club de Marília Pioneiro: “Eles me receberam super bem e ficaram entusiasmados. Mas, como não é um projeto de baixo custo, eles também precisarão de parceiros para nos ajudar”, explicou.

CONFIANÇA

A médica, que concedeu a entrevista ao Jornal da Manhã e ao blog Marília Sustentável, com exclusividade, informou que vai procurar junto à iniciativa privada, clubes de serviço e entidades empresariais, o apoio necessário para tirar o projeto do papel.

Com uma relação imensa de casos para ilustrar, a jovem oftalmologista é movida pela luz que irradia daqueles que cruzaram o túnel escuro da depressão e da baixa autoestima: “Quem consegue a prótese recupera a vida. A gente percebe que é uma diferença muito grande. Quem não consegue entra numa tristeza muito grande. Para a recuperação emocional do paciente a colocação da prótese é fundamental. A pessoa retoma o colorido da vida”, finalizou.

Para saber sobre próteses oculares, acesse: http://ppodigital.com.br/ E para contatar a médica Dra. Simone Ribeiro Araújo de Almeida para conhecer melhor o projeto e apoia-lo, escreva para: sralmeida05@gmail.com 


* Reportagem publicada na edição impressa do Jornal da Manhã, edição de 18.02.2018

domingo, 11 de fevereiro de 2018

INFÂNCIA AMEAÇADA: EDUCANDÁRIO LUTA PARA MANTER SEU PROJETO SOCIAL

Por Célia Ribeiro

Alicerçado sobre os ideais de solidariedade de seus instituidores, o Educandário Bento de Abreu Sampaio Vidal, de tempos em tempos, é submetido a verdadeiros testes de resiliência. Em 2014, recebeu um ultimato para deixar a área pertencente à Santa Casa de Misericórdia de Marília que ocupava desde sua fundação. Em 2016, transferiu-se para uma sede provisória, no Patronato, mantendo grande parte do trabalho voltado aos meninos de 5 a 18 anos. Agora, devido à Lei Federal 13.019/14, corre o risco de deixar para fora nada menos que metade da clientela.
Crianças almoçam na entidade: refeições balanceadas
O que a burocracia oficial não explica é como uma instituição filantrópica, mantida há 61 anos com apoio da comunidade, auxílio de órgãos públicos e clubes de serviço, vai mandar embora justamente os adolescentes na faixa etária mais vulnerável. Pelo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, as Prefeituras não poderão mais custear a manutenção das crianças matriculadas na Rede Estadual, garantindo a ajuda tão somente aos estudantes da Rede Municipal de Ensino.
Vários garotos conseguiram emprego após curso de panificação do Educandário
Situação parecida enfrentam outras entidades de Marília. O que difere o Educandário é sua imensa capacidade de enfrentar adversidades em um curto espaço de tempo e, como se diz, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Para suportar os solavancos, a instituição está sob o guarda-chuva da Sociedade São Vivente de Paulo, à qual pertence como obra unida, e a Associação Amigos do Educandário com seu exército de voluntários.
Nesta semana, o presidente do Educandário, policial militar aposentado Pedro Luiz Alves, e o diretor religioso, Irmão Agenor Lima Rocha, explicaram, durante almoço com as crianças e jovens assistidos, que estão buscando alternativas para enfrentarem a dura realidade. Com muita fé, eles esperam sensibilizar o prefeito Daniel Alonso a manter o acordo de cooperação, além do termo de cooperação que deverá ser celebrado através da Secretaria Municipal da Educação.

Dessa forma, o Educandário manteria os funcionários atualmente cedidos pelo município (professores, cozinheiras, assistente social etc) e alimentação para continuidade das atividades aos 100 inscritos. Os meninos, a partir de cinco anos, são assistidos no período do contra-turno escolar: chegam para o café da manhã, participam de atividades pedagógicas, aulas de informática e esportes, tomam banho, almoçam e vão para a escola. Os que estudam pela manhã chegam para o almoço após as aulas e permanecem na entidade para as oficinas profissionalizantes e prática esportiva.

Procurada, a administração municipal manifestou-se com a seguinte nota da Assessoria de Imprensa: “A Prefeitura de Marília, por meio da Secretaria Municipal de Educação, informa que manterá a parceria com as entidades, como Juventude Criativa, Eurípedes Barsanulfo e Educandário Bento de Abreu, atendendo aos alunos matriculados na Rede Municipal de Ensino, cumprindo assim o que determina a lei”.

CRIMINALIDADE

“Os meninos de 13, 14 anos são os mais vulneráveis e não podem ficar na rua”, observou o presidente do Educandário. Conforme disse, nesta faixa etária, os adolescentes precisam de ocupação, orientação e preparação para o mercado de trabalho que são oferecidos na instituição. Se não tiverem esse apoio, eles correm os riscos oriundos da violência cada vez mais em evidência.
Pré-adolescentes correm o risco de ficarem fora da entidade
O Irmão Agenor acrescentou que “a gente pretende fazer o convênio com a Educação e pedir à Prefeitura que mantenha o acordo de cooperação conosco para a gente manter os funcionários e os nossos alunos do Estado. Hoje, a gente tem 100 crianças, sendo 50 da rede municipal e 50 da rede estadual. Se for atender o que estão propondo para nós, teríamos que mandar 50 crianças da rede estadual embora, justo na idade de periculosidade”.

Destacando a infraestrutura do prédio atual, o presidente lembrou que o Educandário conta com “quadra esportiva coberta, cozinha completa, padaria moderna, salas de aula, sala de informática equipada, banheiros novos, campo de futebol etc. O dever da educação é do município, do Estado e da União. Como entidade, somos parceiros”.
Irmão Agenor  e presidente Pedro Alves em frente à entidade
Ele assinalou que “nós queremos ver as crianças melhores futuramente. Essa responsabilidade que o município está jogando para as entidades fica difícil. Imagine essas crianças jogadas na rua, na fase da adolescência, com droga, com prostituição, com tráfico e pequenos furtos. Na entidade, não. O contra-turno tira esses meninos da rua”, frisou.

SOLIDARIEDADE

Em 2017, durante seis meses, o Educandário não recebeu alimentos do município, o que foi suprido graças aos voluntários, empresas parceiras e clubes de serviço, como o Rotary Clube Alto Cafezal. As despesas são muito altas, apesar do respaldo da Prefeitura. Dessa forma, se nada for feito, quando sair o chamamento para os convênios e os alunos da rede estadual estiverem excluídos, mais do que nunca, o Educandário terá que se reinventar para não deixar essa clientela necessitada à própria sorte.

Além do imenso amor ao próximo, o que mantém a chama da esperança acesa são os frutos que não param de se multiplicar ao longo de seis décadas: “Outro dia, um senhor de São José dos Campos nos contatou através do Facebook do Educandário. Ele contou que se casou, constituiu família, formou seus filhos e era muito grato à entidade por onde passou na infância. Temos muitas histórias como essa. E isso nos dá motivação para não desistirmos”, contou o presidente.
Panificadora: preparação para o mercado de trabalho e fonte de alimentos
Ao longo do ano, o Educandário promove inúmeros eventos para arrecadação de recursos e a programação de 2018 deverá conter vários deles com o apoio dos voluntários e parceiros: almoços, jantares, sorteios etc estão sendo agendados contando com a solidariedade da população.

Como a ave mitológica fênix, que renasceu das cinzas, o Educandário ainda acredita em uma solução a médio prazo. Por isso, faz planos inovadores como a formação de uma horta orgânica e promoção de curso de panificação para as mães dos meninos atendidos, como fomento à geração de renda.
Almoço servido nesta semana

Atualmente, crianças e adolescentes participam do curso ministrado por padeiro certificado que já garantiu vagas no mercado de trabalho a vários deles. Aprendendo a selecionar os ingredientes, porcioná-los e vê-los mudar de forma transformando-se em alimentos, os meninos e pré-adolescentes, moradores das regiões mais carentes das zonas norte e sul, levam para casa uma importante lição: com a orientação adequada, suas mãos podem ser transformadoras e criarem o futuro que tanto sonham!

* Reportagem publicada na edição de 11.02.2018 do Jornal da Manhã

sábado, 3 de fevereiro de 2018

ARTE SUSTENTÁVEL: SOBRAS DE LÃ E RETALHOS SE REVELAM NO TEAR DE ROSSANA CILENTO.

Por Célia Ribeiro

Como a vida, em que os laços se atam e depois desatam para se reconstruírem em outra dimensão, os fios entrelaçados misturam materiais de diferentes texturas ressurgindo em criações com novo significado pelas mãos habilidosas da artista têxtil Rossana Cilento. Esta semana, ela participou do Workshop Tear, na Vila das Artes, em Marília, em uma prévia do trabalho que pretende realizar para compartilhar seu conhecimento.
Rossana foi artista convidada do Bazar da Vila, em dezembro de 2017
Formada em Comunicação e Artes pela Universidade Mackenzie, Rossana Cilento é uma profissional reconhecida e respeitada no mundo da moda. Como Designer Textil, por mais de 30 anos, trabalhou não só na produção (tapeçaria artística, mantas para sofá, jogos americanos, xales, cachecóis etc) como também trazendo arte para produtos de moda e decoração, em São Paulo.
Sobras de lã, linhas e outros materiais se tornam belas criações
Naquela época, ela desenvolvia, “com exclusividade para cada cliente ou estilista, padrões no tear. Eu mesma tecia as amostras piloto que definiam cores e texturas”, cuja produção era terceirizada em Minas Gerais e São Paulo, informou. Entre as grifes, destacam-se Alcaçuz, Lilla Ka, Rosa Chá e estilistas do primeiro time como Reinaldo Lourenço, Alexandre Herchcovitch e Fause Haten. Ela trabalhou, ainda, para a Tok Stock e Camicado (decoração) e Loja do MAM (Museu de Arte
Moderna).
Designer Têxtil: xale da moda

MENINA NA CALÇADA

Rossana Cilento foi atraída pela arte ainda menina: “Desde os seis anos de idade sou apaixonada por fios e agulhas. Eu sempre fui uma tecedeira natural. Nunca tive dúvida que era isso que eu queria fazer. Mas, isso não entrava no que a gente ia estudar para ser alguém quando crescesse. Eu não conseguia definir que eu ia fazer isso por não ser uma profissão”, recordou.

A artista, que queria sentir o impacto do seu trabalho nas pessoas, revelou-se diante de um pedaço de tecido com caseados de crochê. Sentada na calçada, em meio aos olhares curiosos, a menina chamava a atenção da vizinhança: “As mulheres paravam. As vizinhas começaram a me ensinar. Lembro muito bem da dona Inês e da dona Rita me ensinando. Elas faziam coisas lindíssimas”, contou.

Com o passar dos anos, o sonho da arte parecia distante. A opção mais realista foi a faculdade de engenharia. No entanto, as ciências exatas não trouxeram brilho ao seu olhar: “Fiz um semestre e saí correndo. Minha mãe falou para fazer artes. Passei no vestibular e fui cursar Comunicação e Artes”, explicou.

Com o sorriso iluminando o semblante, a artista revelou sua grande descoberta: “Entre outras coisas, aprendi o tear manual. Quando eu vi pela primeira vez, aos 19 anos, eu peguei e já teci. Era como se fosse um encontro. Nunca tive dúvida disso e foi quando começou esse mundo têxtil”.
Patricia Muller e Rossana Cilento na Vila das Artes
Refratária aos rótulos, Rossana afirmou que “ser artista é fazer algo para interferir de alguma forma. O que estou percebendo é que quando você consegue interferir com o que você faz, numa emoção, em alguma sensação, é um trabalho artístico. Trabalhei a vida toda com essa arte voltada para o mercado porque eu sobrevivi com essa arte em São Paulo. Eu teci para comer, digamos assim. Trabalhei com tear profissionalmente”.

Na época da faculdade, Rossana conheceu muita gente e descobriu um universo paralelo repleto de criatividade. “Comecei fazendo arte, mesmo, com a tapeçaria. Fiz a primeira peça e vendi, fiz a segunda e vendi, e assim por diante”, explicou o mergulho na fase produtiva que logo mostrou um lado amargo.
Artista reconhecida saiu em várias
publicações da moda

“Só que a arte é um caminho dificílimo. Uma hora ela é e outra hora não é. Chegou um momento que a tapeçaria artística teve uma queda, porque o mercado tem isso”, relembrou contando que iniciou a produção comercial com um grupo de tecelões. Eles criavam e terceirizavam a produção.

Com seus trabalhos cada vez mais valorizados, Rossana Cilento partiu para a formalização, abrindo empresa com funcionários para dar conta das encomendas. Mas, como a criatividade sempre falou mais alto com ela, o caminho de designer têxtil estava traçado. Foi quando mergulhou no mundo da moda.

“Interpretava o que os estilistas queriam para o tecido, me especializei nisso, nesta tradução. Foi uma coisa muito legal e que me dá muito prazer fazer”, assinalou. E o reconhecimento a tornou uma das referências da área com direito a reportagens em revistas da moda onde exibia suas criações geradas no tear.

VOLTA ÀS ORIGENS

Hoje, aos 61 anos, Rossana leva uma vida tranquila na cidade de Tupã para onde mudou-se com o marido em 2008, por razões profissionais. No entanto, a arte que nasceu com ela se transmutou, nos últimos 10 anos, e renasceu de uma maneira surpreendente. A artista trabalha com desconstrução e reconstrução de materiais: uma camiseta velha pode ser cortada em tiras que se juntam a tecidos coloridos, fios de lã, papelão e toda sorte de materiais descartáveis.
Ateliê em Tupã

No ateliê que montou em casa, além do tear inseparável, ela trabalha técnicas que utilizam pedaços de papelão como base. Foi o caso do Workshop Tear de quinta-feira (31), na Vila das Artes. Para aprenderem tapeçaria artística, as alunas tramaram fios e tecidos em um suporte de bandeja de papelão descartável.

Ela narra esse recomeço com muita alegria: “Fui voltando para o artístico, na minha pesquisa solitária, em casa. Até tirar a linha de produção de mim, para limpar isso, levei uns 5 anos porque eu sentava com um fio e pensava em mercado. O que me ajudou muito a sair disso foram as redes sociais. Eu fazia, postava e tinha o retorno”, observou.

HORA DE COMPARTILHAR

A artista falou com entusiasmo sobre a nova fase que se desenha no horizonte: “Sinto que hoje eu estou com impulso gigantesco de trazer isso para trocar com as pessoas. Foram 10 anos de muito contato e muito desenvolvimento para ficar só para mim. Tenho vontade de proporcionar, de trocar isso que eu tenho, que é muito antigo e muito consistente, para as pessoas sentirem que isso pode ser maravilhoso mesmo em um momento de interrupção”.
Cores vivas nesta peça  que mistura materiais
Ressaltando que não tem formação terapêutica, a artista fala dos benefícios que uma pausa na correria do dia-a-dia pode proporcionar a todas as pessoas: “Quem tiver um intervalo, de duas ou três horas, em contato com a arte e interromper o contato com a tecnologia, vai ter uma possibilidade de saúde”.

Concluindo uma peça de tapeçaria, a psicóloga Maristela Colombo, concordou com a colocação de Rossana, a quem conhece de longa data. Elas se reencontraram a partir das redes sociais quando Maristela se interessou por fotografias de trabalhos da artista para usar em um congresso da área.
Bandeja descartável de papelão fez as vezes de tear no workshop
E de lá para a participação no workshop foi um pulo: “Gosto muito de artesanato e nunca tive muito tato. Acho muito lindo e estou encantada e muito feliz de ter feito. A gente ficou aqui tecendo. É um tempo que você para, é uma terapia. Você sai fora de outro foco para voltar para algo que é seu, seu interior, a escolha da linha, a escolha do tecido, da cor. Cada um escolhe uma coisa diferente e você tira de dentro para fora. Alinhavando, colorindo”, disse, enquanto arrematava o trabalho.

Fundadora da Vila das Artes, Patrícia Muller trouxe Rossana Cilento como artista convidada para o Bazar da Vila, realizado em dezembro. Na oportunidade, as pessoas puderam conhecer o tear e as crianças mostraram muito interesse, o que abriu a possibilidade de promoção de cursos para adultos e crianças, neste ano.
Maristela Colombo e sua criação: tecendo com alegria
“A ideia é que qualquer pessoa tem que experimentar. As pessoas, desde pequenas, crescem achando que não têm jeito para isso. Todo mundo consegue e se surpreende com o resultado. Todo mundo é artista e só precisa procurar dentro de si, mas deixa lá guardado e vai uma vida inteira sem experimentar essa emoção fantástica”, pontuou Patrícia Muller.

Quanto à Rossana, está entusiasmada para trazer a Marília a garotinha que sentava na calçada e que ela reencontra toda vez que entra em seu ateliê para criar. Essa pequena artista, que vive em seu interior, cresceu, ganhou o mundo, mas volta sempre ao universo das linhas para brincar com as cores.
Para contatar a artista, o e-mail é: rossanacarmencilento1@gmail.com