domingo, 9 de junho de 2013

EM BUSCA DO NÉCTAR, ABELHAS MORREM ENVENENADAS NAS FLORES DAS ESPATÓDEAS DO BAIRRO LORENZETTI.

Por Célia Ribeiro

“Espatódea, gineceu, cor de pólen, sol do dia”...Quando Nando Reis compôs a canção “Espatódea” para homenagear a filha Zoé, de lindos cabelos ruivos, não imaginava que esta espécie de árvore, originária da África e muito comum no Brasil, seria responsável pela mortandade de abelhas na zona urbana. Em Marília, o fenômeno chamou a atenção do apicultor Wenceslau Gomes Soares, o “Lau”, que luta para erradicar as espatódeas do bairro Lorenzetti, na zona oeste da cidade.
 
Flor guarda abelhas em decomposição
Barbeiro por profissão, Lau dedica-se à apicultura há mais de 40 anos. Membro da Associação de Apicultores de Marília, ele é uma das referências na produção de mel, própolis, cera e pólen conforme reportagem desta página mostrou na edição de 15 de janeiro de 2012. Junto com o amigo Dirceu Manzon, também aposentado da SUCEN (Superintendência para Controle de Endemias), possui apiários em casa por distração e dedica-se à apicultura comercial nas colmeias instaladas ao longo da mata ciliar do Rio do Peixe.

Esta semana, preocupado com o grande número de abelhas mortas, encontradas nas flores que se desprenderam das espatódeas do bairro, ele desabafou: “Com tantas espécies de árvores boas para plantar, ainda insistem em ter quaresmeiras, espirradeiras e espatódeas que são veneno puro para as abelhas. No dia em que acabarem com as abelhas, também vai acabar o homem”.

Bem informado quando o assunto é apicultura, Lau observou que as agressões constantes ao meio-ambiente estão afetando diretamente as abelhas, responsáveis pela polinização de milhares de espécies de plantas. Sem elas, os reflexos ao equilíbrio do ecossistema são incalculáveis, frisou.
 
Lau caminha sob a espatódea do bairro: desolação
“Na Europa, os produtores de mirtilo pagavam 40 dólares por colmeia para garantir a polinização. Hoje, estão pagando 150 dólares por colmeia porque as abelhas estão desaparecendo”, ressaltou o apicultor que espera ver em prática a resolução que prevê certos cuidados na aplicação de defensivos agrícolas em áreas exploradas pela apicultura.

INDIGNAÇÃO

Lau caminha pelas ruas do bairro, onde vive desde 1.954, como quem conhece cada palmo de chão. E por justamente estar familiarizado com o lugar que notou o desaparecimento das abelhas. Não foi preciso ir longe para descobrir a causa da mortandade: várias espatódeas, plantadas no entorno da Escola “Prof. Antônio Gomes de Oliveira”, com suas flores de cores fortes, num misto de laranja avermelhado, são a porta da morte para as abelhas.
 
Apicultor há 40 anos, Lau explora comercialmente a produção de mel.
(Foto: Ivan Evangelista Jr.)
“Nesta época do ano as árvores quase não têm flores. Sem alimento, as abelhas vão atrás do néctar das espatódeas e morrem”, afirmou o apicultor mostrando várias flores murchas onde podem ser vistas as abelhas em decomposição em seu interior.

“A Prefeitura precisa erradicar essas árvores. Não é possível manter as espatódeas que envenenam os insetos”, acrescentou Lau, comentando que “um tempo atrás andaram cortando as espatódeas pela cidade. Mas, não tiraram todas, como se vê aqui no bairro. É preciso fazer alguma coisa urgente”.
 
Apicultura exige técnica e cuidados especiais
(Foto: Ivan Evangelista Jr.)
Consultado sobre o assunto, o secretário municipal do Meio-Ambiente, Leonardo Mascarin, afirmou não ter recebido nenhuma denúncia sobre as árvores venenosas. Mas, assegurou que determinará a realização “de um levantamento e, se for o caso, elaboraremos um plano de trabalho para cuidar do problema”.

FENÔNEMO

Segundo o zootecnista Valter Eugênio Saia, da Secretaria Municipal da Agricultura, e um dos maiores especialistas em Apicultura, o néctar das espatódeas “contém um piretroide natural que mata os insetos. É uma forma natural de a planta garantir matéria orgânica com os restos dos insetos que funcionam como adubo. Agora, não é comum matar abelhas. Sabe-se da morte de vespas e marimbondos”.
 
Ao lado do muro da escola, a espatódea que
ameaça as abelhas no bairro Lorenzetti
O especialista ponderou que uma das causas desse fenômeno talvez seja o excesso de chuva das últimas semanas. “Como choveu bastante e lavou o néctar das flores, as abelhas podem ter ficado sem opção e procurado as espatódeas. As abelhas da região urbana têm dificuldade de encontrar uma fonte de néctar saudável”.

Enquanto o fenômeno não é totalmente esclarecido, resta ao Lau improvisar para garantir a vida dos poucos enxames que mantém em casa: ele está colocando mel nas colmeias para impedir que as abelhas voem longe em busca de alimento. “Seria o voo de morte!”, finalizou.

Reportagem publicada na edição de 09.06.2013

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seja bem-vindo(a). Seu comentário será postado, em breve.