domingo, 28 de agosto de 2011

GRUPO DE ESTUDOS CAPACITA MULTIPLICADORES NA COMUNIDADE PARA COMBATER O ÁLCOOL E AS DROGAS

Por Célia Ribeiro

Quem passou dos 40 anos deve recordar a espécie de “batismo” que lançava os rapazes na vida adulta: eram autorizados a experimentarem o cigarro e a bebida alcoólica e, não raras vezes, iniciavam sua vida sexual, em locais de má reputação, levados pelo pai ou tio mais velho. Os tempos mudaram e com a modernidade vieram novos hábitos, invariavelmente nocivos, que levam meninos a mergulharem em águas turbulentas sem boia ou colete salva-vidas.

Para desespero dos pais do século XXI, essa realidade não afeta apenas os meninos. As garotas, inspiradas no glamour de suas artistas favoritas, amadurecem antes da hora querendo parecer adultas. Como os rapazes, elas também estão consumindo álcool ainda na puberdade, chegando à beira do precipício que representa a dependência química, primeiro do álcool e depois das drogas ilícitas.
Na DDM, reuniões quinzenais do grupo de estudos

Para refletir sobre esse quadro sombrio, além de louváveis iniciativas de entidades beneficentes e organizações não governamentais (ONGs), a comunidade mariliense ganhou um grupo que tem se debruçado sobre a problemática para estudar as causas e prevenir o uso indevido de drogas entre os jovens.

Com reuniões quinzenais na sede da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), o grupo de estudos é coordenado pelo psicólogo Antônio Carlos Gelsi, do Núcleo de Apoio Multidisciplinar (NAM) da delegacia, que conta com a participação da assistente social Cássia Giandon (do NAM) , da psicóloga e conselheira tutelar, Maria Aparecida Soares de Melo, de membros da Pastoral da Sobriedade e da Pastoral da Família (da igreja católica), entre outros.

Segundo Gelsi, o grupo foi iniciado pela Dra. Marília Mazeto, que trouxe a proposta do curso de formação de multiplicadores na comunidade. Com 20 capítulos, os trabalhos iniciados no fim de 2.010 já estão no 11º, e são destinados a “capacitar conselheiros e lideranças comunitárias para a prevenção ao uso de álcool e drogas ilícitas”.

Bebida cada vez mais cedo (Foto Google Imagem)
O psicólogo afirmou que quando o NAM aceitou o curso percebeu que “os conhecimentos iriam acrescentar muito, sendo um aprendizado a mais porque nós mexemos muito com a dependência química entre os casos envolvendo a violência doméstica; ou o agressor é usuário ou a própria vítima”, assinalou.

Antônio Carlos Gelsi informou que “um dos pontos fortes do nosso trabalho no grupo de multiplicadores é atacar também as drogas lícitas que são o cigarro e o álcool”. Conforme disse, pesquisas indicam que “o álcool faz mais mal à sociedade que propriamente as drogas ilícitas”.

O psicólogo observou que a sociedade deve se mobilizar para alcançar medidas e campanhas contra o álcool nos moldes do que já foi conseguido em relação ao cigarro. “A gente acredita que é um trabalho um pouco mais lento e demorado porque a indústria da bebida é muito mais forte e a população não vê o álcool como uma droga”, disse.
Socializando conhecimento
Ele prosseguiu citando que a sociedade encara as bebidas alcoólicas como algo inofensivo, “que faz parte da cultura, das famílias comemorarem através da bebida. Até em festa de criança tem bebida alcoólica para os adultos. O pessoal acha normal e nas geladeiras das casas tem cerveja disponível. Por isso, a criança e o adolescente crescem sabendo que a bebida é uma coisa natural e eles vão fazer uso disso”.

Finalizando, o psicólogo disse que “tem família que controla, mas tem família que não consegue controlar o jovem e impor limites”. Como resultado, os casos de alcoolismo estão se multiplicando sob os olhares espantados das famílias.

CRACK AOS 08 ANOS

Gelsi e Maria Aparecida
Conselheira tutelar há 03 anos, a psicóloga Maria Aparecida Soares de Melo fala com tristeza dos casos que acompanhou envolvendo crianças e adolescentes. Um dos mais chocantes foi o do menino, de apenas 08 anos, que está internado para tratamento: é viciado em crack! A mãe, usuária de drogas e soropositiva (HIV), não tem a menor condição de assistir o filho; o irmão mais velho enveredou para o mundo do crime e está detido.

A psicóloga classificou de “muito grande a vulnerabilidade em que se encontram essas famílias” e que o que “leva as crianças a estarem inseridas no mundo das drogas demandaria políticas públicas que não são suficientes para atender a demanda. Muitas vezes, você se vê de mãos amarradas porque tem que trabalhar coisas bem anteriores com essas famílias”, desabafou.

Como conselheira tutelar, Maria Aparecida acompanhou inúmeros casos de crianças em situação de risco. Em sua opinião, “teria que trabalhar as políticas públicas, a educação, o envolvimento dessas famílias para que elas estejam realmente inseridas em um programa de assistência, de trabalho, para se comprometerem realmente com os filhos colocados na escola, tendo acesso à saúde”.

Ela revelou um dado estarrecedor: “Antigamente, falava-se em 12 ou 13 anos; hoje, como conselheira a gente vê que na prática isso está em 08 anos. Temos o caso de uma criança envolvida com crack, com drogas pesadas e você vai ver, a família está toda desintegrada e a mãe não tem condição psíquica, física ou emocional para lidar com seus próprios filhos que são dependentes. Esse é um caso que choca bastante”.

Ela elogiou o trabalho da Pastoral da Sobriedade da igreja católica que tem um trabalho inovador já documentado em abril pelo Correio Mariliense: “Eu fui a um congresso em que se falou que é preciso ter uma base religiosa” para apoiar as famílias.

Casada e com 03 filhos, a conselheira tutelar disse que a complexidade do problema é tamanha que será preciso pensar também no depois: “Essas famílias ficam meses, um ano em tratamento e depois quando elas retornam não temos um aparato, não temos suporte para recebê-las”.

DAMASCENO QUER FISCALIZAÇÃO

Vereador Delegado Wilson Damasceno
O vereador Wilson Damasceno (PSDB) conhece bem os reflexos do avanço do álcool e das drogas entre os adolescentes. Com a experiência adquirida em uma sólida carreira como delegado de Polícia, o vereador apresentou um requerimento, na última segunda-feira, solicitando informações sobre a fiscalização quanto ao ingresso de crianças e adolescentes em bares, boates e chácaras onde são promovidas festas universitárias regadas a álcool.

 “Não tem nenhum tipo de fiscalização. A molecada está solta no mundo. Quando tem denúncia, a fiscalização vai ao local verificar, mas penso que teríamos que ter um trabalho integrado, uma força tarefa envolvendo o Conselho Tutelar, o Juizado de Menores e a Polícia Civil”, assinalou o vereador que também é diretor do Conselho Municipal de Entorpecente (Comen).

Para o vereador, “tem pais que não conseguem segurar os filhos na adolescência e tem os pais omissos. Quando acontece isso, há necessidade de uma intervenção do poder público”.

DADOS ALARMANTES 
Meninas bebem tanto quanto os meninos (Foto Google Imagem)

Informações veiculadas no portal http://adroga.casadia.org/alcoolismo/alcool_e_adolescencia.htm  dão conta de dados alarmantes. Um estudo piloto com adolescentes usuários que buscaram atendimento ambulatorial mostrou que o uso de drogas se iniciou, em média, aos 11 anos com o consumo de álcool, o uso regular aos 13 anos, evoluindo para o uso do tabaco (12 anos), maconha (13 anos), inalantes (13 anos) cocaína via inalatória (14 anos), crack (14 anos), alucinógenos (15 anos) e cocaína endovenosa (16 anos). Na amostra estudada, embora o álcool tenha sido a primeira droga consumida, foi a última a apresentar uso problemático (Scivoletto, Henriques Jr. & Andrade, 1997).

De acordo com dados do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), pesquisa com estudantes de 1º e 2º Graus de 10 capitais brasileiras, 65% dos entrevistados afirmaram consumir bebidas alcoólicas, dos quais 50% iniciaram o uso entre os 10 e 12 anos de idade (Galduróz, Noto & Carlini, 1997).

 Reportagem publicada na edição de 28.08.2011 no Correio Mariliense

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